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sábado, 15 de dezembro de 2012

E quem fez (e faz) o papel de Mefistófeles?

Na conhecida tragédia de Goethe, "Fausto", este autor alemão expressa a opinião de que o papel-moeda é uma extensão da alquimia por outros meios. Esse ponto de vista é claramente evidente na posição atual da Alemanha relativamente à crise da zona euro, defende o correspondente do jornal "The Irish Times" em Berlim.
Para quem tentar compreender a atitude alemã em relação ao dinheiro e à dívida, na crise da zona euro, todos os caminhos vão dar a Frankfurt.
A capital financeira da Alemanha abriga não apenas 2 bancos centrais, o Bundesbank e o Banco Central Europeu, mas também um edifício barroco amarelo, por trás da torre do BCE. Foi ali que, em 1749, nasceu o génio literário da Alemanha, Johann Wolfgang Goethe.
Agora um museu, a Goethe Haus tem em exibição uma exposição fascinante, Goethe e o Dinheiro (Goethe und das Geld), que explora o modo como as atitudes da sociedade influenciaram a escrita de Goethe, que, por seu turno, modelou a atitude alemã perante o dinheiro.
Goethe nasceu em berço de ouro, graças ao próspero negócio da família e a alguns casamentos vantajosos. Embora mantivesse relações sociais com várias famílias de banqueiros – Goethe quase casou com uma mulher de uma delas – as perdas sofridas por essas instituições depois das guerras napoleónicas deixaram no escritor uma desconfiança nos bancos que durou a vida inteira.
Trabalho sequioso
As contas da família do escritor mostram que este estava longe de corresponder ao estereótipo do alemão poupado, gastando por vezes 15% dos seus rendimentos anuais em vinho. Os resgates da sua mãe e dos seus empregadores foram recorrentes. Como salientam os curadores da exposição, Goethe argumentava que o seu comportamento de gastador era “essencial para o desenvolvimento da sua personalidade”.
Tornou-se mais rigoroso quando, depois de 1782, foi ministro das Finanças do ducado de Saxónia-Weimar, onde hoje se situa o Estado da Turíngia. Essa experiência modelou o seu pensamento e contribuiu para a criação da sua obra-prima literária, Fausto, de leitura obrigatória em todas as escolas alemãs, que se centra no célebre "pacto de Fausto" do erudito homónimo com o demónio Mefistófeles.
O demónio promete fazer tudo o que Fausto quiser na Terra, mas, se Fausto alguma vez desejar que um determinado momento dure para sempre, Mefistófeles fica com a sua alma. A parte II de Fausto, publicada postumamente, tem início na corte falida de um imperador hedonista. O tesoureiro real informa que os "os cofres continuam vazios", tal como as adegas, devido às festas frequentes.
O persuasivo Mefistófeles aparece com a proposta de transformar papel em dinheiro. O imperador endividado fica curioso: "Estou cheio do eterno Como e Quando / Falta dinheiro: pois bem, arranje-o." As notas assinadas pelo imperador fazem disparar o consumo e, assim, "metade das gentes só querem comer bem / a outra metade só quer ostentar novos trajes". Só depois de Mefistófeles e o seu parceiro Fausto desaparecerem alguém repara que o valor das notas não corresponde a qualquer equivalente real – ouro num cofre, por exemplo – e, sim, à promessa de ouro que ainda é preciso extrair da mina.
Os paralelos não passaram despercebidos aos leitores contemporâneos de Goethe: entre a história de Fausto e o capital necessário para impulsionar a revolução industrial. As suas advertências voltam a ser relevantes para as inúmeras figuras públicas alemãs que se aproveitam de Fausto para formular as suas preocupações relativamente à crise da Zona Euro.
O pacto faustiano do BCE
O papel moderno do tesoureiro do imperador em Fausto, que alerta para o sistema do papel-moeda, foi assumido pelo presidente do Bundesbank, Jens Weidmann. “Se um banco central puder cunhar dinheiro sem limites, a partir do nada, como pode esse banco garantir que o dinheiro é suficientemente reduzido para manter o seu valor?”, perguntou Weidmann numa reunião, em setembro. “A tentação existe sem dúvida e boa parte da história monetária cedeu à tentação.” Weidmann adverte que o programa do BCE de compra ilimitada de obrigações, para estabilizar a zona euro, é potencialmente um pacto de Fausto, se oferecer aos políticos uma alternativa de financiamento mais agradável que as dolorosas reformas económicas.
O BCE argumenta que não é disso que se trata e as diferenças de pontos de vista fizeram ressurgir a ambivalência cultural em relação ao dinheiro e a dívidas, na Alemanha. Afinal, neste país, a palavra Schuld significa tanto dívida monetária como culpa moral. As intervenções do BCE no mercado de obrigações foram criticadas pelos mesmos economistas moralistas que atacaram os países endividados da zona euro, chamando-lhes Schuldensünder, ou “pecadores da dívida”.
Há, portanto, uma ligação entre atitudes de hoje e o Fausto de Goethe, que o teórico literário alemão Werner Hamacher considera como uma crítica da “estética do crédito e economia da persuasão”.
Ottmar Issing, antigo membro da Comissão Executiva do BCE, sugere que os alemães não têm dúvidas quanto ao dinheiro em si, mas são pessimistas quanto a este ser ou não utilizado de forma sensata. Num texto para o catálogo da Goethe e o Dinheiro, intitulado “Inflação – a obra do diabo?”, Issing defende que “a escolha entre bênção e maldição” oferecida pelo papel-moeda “está nas mãos da humanidade”. O antigo presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, concorda. Noutro texto, aplaude o debate de Goethe ao longo de toda a sua vida sobre o caráter dual do papel-moeda, que “produz o melhor e o pior na esfera económica”.
Viver dentro das possibilidades
Para o professor Hans Christoph Binswanger, autor de ‘Dinheiro e Magia’ – Uma crítica da economia moderna à luz de Fausto, Goethe encarou o papel-moeda como “a extensão da alquimia por outros meios”. Para transformar papel-moeda em riqueza real, defende o professor Binswanger, Goethe receou que tudo viesse a ser “arrastado para o processo de combustão lenta da produção mundial”. “A aparentemente mágica alquimia moderna suporta um preço profano, transforma o mundo num vazio”, acrescenta.
Os receios de Goethe ressurgiram no ponto de vista alemão predominante de que a crise da zona euro é o resultado destrutivo de empréstimos descontrolados e imprudentes, contraídos por sociedades que se recusam a aceitar os limites naturais das suas finanças. O colapso económico é, por conseguinte, um fio condutor que perpassa pelo trauma nacional da Alemanha e pelo seu drama nacional.
Fausto e Mefistófeles estão escondidos, à espreita da crise da zona euro, colorindo as exigências de Berlim de disciplina orçamental pan-europeia e lançando o debate, na Alemanha, sobre os limites do crescimento económico.
“Goethe viu que, quando utilizado adequadamente, o dinheiro traz consigo oportunidades positivas, como a ascensão da sua própria família”, disse Vera Hierholzer, uma das curadoras da mostra Goethe e o dinheiro. “Ao mesmo tempo, como muitos outros da sua classe, Goethe tinha medo das consequências do excesso e da exorbitância, de se querer sempre mais. É um ponto de vista muito alemão, mesmo hoje, ter em conta os limites e tentar controlar as coisas dentro desses limites.”
O debate sobre o autocontrolo monetário tem relevância para além da Alemanha de Goethe, em especial entre os países em crise, impacientes por se libertarem do jugo da troika e "regressarem aos mercados".
Curiosamente, alguns dos últimos leilões de dívida soberana da Irlanda foram presididos pelo defunto Brian Lenihan, no enorme Frankfurter Hof hotel, localizado a meio caminho entre a torre do BCE e a Goethe Haus.
Depois de recuperar a soberania económica, cabe à Irlanda decidir qual o passo seguinte. Na direção da Goethe Haus, sem pôr em perigo os limites dos seus meios financeiros, ou de volta ao hotel de 5 estrelas Frankfurter Hof, para ser a anfitriã das dispendiosas reuniões ao pequeno-almoço com bancos dispostos a emprestar-nos mais dinheiro de Mefistófeles.

Ecos da blogosfera – 15 dez.

Ainda há quem nos considere Pessoa(s). Obrigado!

Richard Zenith, cidadão de Portugal
Investigador, tradutor e ensaista, Richard Zenith tornou-se, esta sexta-feira, na primeira personalidade estrangeira a vencer o Prémio Pessoa, mas a merecê-lo por se dedicar a uma obra, literatura e língua portuguesas, defendeu o júri do galardão.
Richard Zenith nasceu há 56 anos nos Estados Unidos, onde se licenciou em Letras, mas mudou-se para Portugal no final dos anos 1980, já apaixonado pela diversidade heteronímica da obra de Fernando Pessoa.
O investigador tomou contacto com a obra do poeta ainda nos anos 1970, nos Estados Unidos. Chegou a viver na Colômbia, no Brasil - onde aprendeu melhor a língua portuguesa - e em França, antes de se mudar para Portugal.
O júri do Prémio Pessoa sublinhou que Richard Zenith se tornou "cidadão de Portugal por dedicação e louvor a uma obra, a de Fernando Pessoa", mas também à literatura e língua portuguesas.
As investigações do espólio de Pessoa levaram Richard Zenith a fazer uma edição de "Livro do Desassossego", de Bernardo Soares, e a vertê-la para inglês.
Em 2008 lançou a elogiada fotobiografia do poeta e atualmente prepara uma biografia, ainda sem prazo de finalização e edição.
"Este prémio [Prémio Pessoa] ajuda a viabilizar o meu trabalho sobre a biografia já que ninguém me está a pagar agora, não tenho uma mensalidade para esse trabalho da escrita da biografia portanto isso é bem-vindo, claro", disse à agência Lusa.
Através da Assírio & Alvim, Richard Zenith publicou algumas obras inéditas de Fernando Pessoa, fruto da aturada investigação do espólio do escritor, como "A Educação do Estóico", mas também cartas, prosa, poesia inglesa.
Apesar de ser um pessoano convicto, Richard Zenith traduziu para inglês e divulgou internacionalmente a obra de escritores como António Lobo Antunes, Luís Vaz de Camões, Sophia de Mello Breyner Andresen e José Luís Peixoto.
Este ano, Zenith foi o curador e co-organizador de uma das maiores exposições dedicadas a Fernando Pessoa, que esteve patente na Fundação Calouste Gulbennkian, em Lisboa, e anteriormente no Brasil.
Além do Prémio Pessoa, Richard Zenith já foi distinguido em 1999 com o Pen Award de poesia pela tradução de poemas de Fernando Pessoa e heterónimos, e em 2002 com o prémio Calouste Gulbenkian pela tradução de "Livro do Desassossego" para inglês.
A tradução de poemas do autor João Cabral de Melo Neto valeu-lhe em 2006 o Prémio de Tradução Harold Morton.
Miguel Veiga, um dos elementos do júri, sublinhou à agência Lusa que Richard Zenith "é um premiado que indiscutivelmente" mantém viva a obra de Fernando Pessoa em Portugal e no estrangeiro.
Richard Zenith é o vencedor do Prémio Pessoa 2012, no valor de 60 mil euros. O júri, presidido por Pinto Balsemão, justificou esta escolha com o seu papel enquanto tradutor.
Correio da Manhã – Como se sentiu ao saber que era o vencedor do Prémio Pessoa 2012?
Richard Zenith – Como quase todos se sentem: muito surpreendido, contente e também cheio de dúvidas. Porquê eu? Será que outras pessoas não mereceriam o prémio? Mas fico muito contente e acho interessante que o prémio tenha sido dado a um português relativamente novo. Vivo cá há 25 anos mas tenho cidadania portuguesa só há três.
– Porque decidiu naturalizar-se português?
– No início era mais por razões práticas. Tinha de renovar a minha autorização de residência de cinco em cinco anos e fi-lo para tornar--se mais fácil. Mas depois achei que fazia todo o sentido, pois tenho uma relação afectiva forte com Portugal. É o meu país de adopção.
– É um grande conhecedor da obra de Fernando Pessoa. O que o levou a gostar tanto deste escritor?
– Fernando Pessoa tem o dom de ser intensamente português e ao mesmo tempo universal. É isso que nos atrai: Tem um modo de escrever que faz com que se sinta aquilo que é escrito, como se estivesse a falar connosco.
– O que tem a literatura portuguesa de diferente das restantes?
– A grande literatura transborda fronteiras linguísticas. Mas posso dizer que, sem menosprezar outras áreas, a literatura parece-me ser o forte da cultura portuguesa. É um privilégio poder divulgá-la em língua inglesa.
– A nossa literatura começa a ser mais reconhecida lá fora?
– Sim. E Pessoa tem ajudado nisso. Há escritores que se mostram um bocado ciumentos e invejosos em relação ao sucesso dele. Há alguma verdade nisso, mas também é verdade que, graças a ele, lá fora começam a interessar-se mais por outros escritores. Ele é uma porta de acesso para a literatura nacional.
– Como vai usar o prémio de 60 mil euros?
– Não faço ideia. Ainda não me habituei ao facto de o ter ganho.

Ou seja, a “supervisão” bancária para que(m) serve?

Passados 13 anos desde a sua introdução, o euro conseguiu estabelecer-se como 2ª moeda mais importante do mundo, mas, mesmo assim, a moeda ainda é vista como 2ª opção.
Zhang Danhong
Atualmente os Estados Unidos passam por uma séria discussão orçamental entre democratas e republicanos. Caso não cheguem a um acordo até ao fim do ano, entrarão em vigor cortes no orçamento anual e aumentos de impostos à volta de 600 bilhões de dólares. Isso fará com que a economia do país entre em recessão.
Em função da ameaça de "abismo fiscal" (fiscal cliff), o dólar desvalorizou-se em relação ao euro. Mas nem por isso há temores de que os países que adotam a moeda se desmoronem economicamente, nem que o dólar possa algum dia vir a desaparecer.
Ao euro, por sua vez, só resta a inveja de uma crença tão ardorosa na solidez do dólar. Pois mesmo diante da negação do BCE de que há um perigo iminente de desintegração da união monetária europeia, o euro não é considerado, de facto, uma moeda segura. A OCDE, por exemplo, continua a ver riscos na existência da zona do euro.
Governo central forte
Mas o que o dólar tem, que o euro não tem? "Muita coisa", diz Achim Wambach, diretor do Instituto de Política Económica da Universidade de Colónia. Primeiro, o dólar tem um governo central forte. "Grande parte do orçamento fiscal passa por Washington e não pelos estados norte-americanos separadamente", afirma Wambach.
A união monetária europeia, por sua vez, não é uma união política. O orçamento de toda a UE corresponde a 1% do PIB conjunto dos países-membros do bloco. E a zona do euro não tem sequer um orçamento próprio.
Bancos independentes
A grande interdependência entre os bancos da zona do euro e os respetivos países individualmente é outro calcanhar de Aquiles da moeda. Os exemplos da Irlanda e da Espanha mostram como bancos e Estados se podem arrastar mutuamente abismo abaixo.
Para o economista Clemens Fuest, o grande erro do euro é o facto de o sistema financeiro não ter sido adequado à união monetária. "Deveria ter sido previsto que, dentro da união monetária, um país pode tornar-se insolvente, e que deve ser possível, nesse caso, um corte na sua dívida", diz Fuest.
Para que isso ocorra, os bancos precisam ser tão sólidos que possam suportar tal corte. Ou seja, teriam que ter mais capital próprio, completa o economista. Os EUA, por exemplo, jamais teriam bancos que fossem dependentes dos seus estados federados, opina Wambach: "Se a Califórnia declarasse insolvência, os californianos não precisariam preocupar-se com as suas poupanças, pois essas não estariam num banco californiano, mas num banco americano", compara o economista.
Sem perigo de contágio
Isso explica, inclusive, o baixo perigo de contágio entre os bancos norte-americanos. Se o estado de Minnesota está ameaçado de falir, o estado de Michigan não correrá risco de ser arrastado. Ao contrário da zona euro: aqui, qualquer ponto de crise guarda em si o potencial de alastrar o fogo. Caso a Grécia deixasse a zona euro, a pergunta seguinte seria: qual é o próximo?
Esta é também a razão pela qual a proibição de auxílio que consta dos contratos da UE não é levada a sério pelos mercados financeiros. De forma que cada país que adota o euro carrega ele próprio pouca responsabilidade pela sua própria política fiscal, uma vez que, na pior das hipóteses, poderá cogitar a possibilidade de ser salvo pelos outros.
Cada país por si
Ao contrário dos EUA, onde cada estado arca com as suas próprias dívidas. Se um deles tem sérios problemas financeiros, precisa economizar radicalmente. Há um mecanismo que cessa automaticamente o orçamento, explica Wambach, tomando a Califórnia novamente como exemplo: "Vimos no meio da crise que os funcionários das universidades foram obrigados a tirar férias prolongadas e tiveram os seus salários reduzidos".
Outra medida que contribui para a disciplina orçamental dos estados norte-americanos é a quitação anual das dívidas nas contas das 12 filiais do Fed, o Sistema Federal de Reservas dos EUA. Isso existe para evitar que as regiões em dificuldades financeiras façam uso da emissão de dinheiro à custa dos outros.
O BCE não é o Fed
Mario Draghi, presidente do BCE, prometeu em meados deste ano, que o BCE iria fazer de tudo para salvar o euro. Mas enquanto o Fed apoia o dólar, e o Bank of England, a libra esterlina, o BCE não está em condições de tomar decisões rápidas que protejam o euro.
Esta talvez seja a diferença mais crucial entre o dólar e o euro. Embora o seu mandato tenha sido prorrogado no meio da crise, "o BCE continua a ser, como antes, uma instituição federal, ancorada em 17 Bancos Centrais nacionais. Não é um banco ativo autónomo. Por isso, o euro continua a ser uma moeda frágil", disse Marsch.

Contramaré… 15 dez.

O número de pessoas com emprego em Portugal caiu 4,1% no 3º trimestre deste ano, em comparação com o mesmo período de 2011, um recuo superior à média da zona euro, que foi de 0,7%, indica o Eurostat.
Portugal manteve a tendência de queda, ainda que o recuo tenha sido  ligeiramente inferior às quebras de 4,2% registadas nos 2 primeiros trimestres  deste ano. 

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

A angústia de um país acéfalo num próximo futuro?

Jovens cientistas e com rendas para pagar desesperam. Ninguém os ouve. Não há amor à ciência que resista assim. E não importa a justificação oficial, porque ela não serve como talão de desconto no supermercado.
Filipa Marques*
No trânsito de Lisboa e a caminho de mais um dia de trabalho, faço mentalmente a lista de colegas e amigos cientistas que emigraram nos últimos anos. Somo uns quantos e sei que serão mais em breve. Como em qualquer outra área, sempre houve gente a emigrar em busca de melhores oportunidades. Dizem uns que até é bom porque aprendem lá fora e a maioria irá voltar. Concordo com a primeira parte, é bom aprender lá fora. Duvido da segunda; a maioria que vai, hoje mais do que nunca, não volta tão cedo, simplesmente não pode.
É gente qualificada que parte. E é Portugal que mais perde. Falo principalmente de jovens outrora bolseiros de investigação científica. O país investiu nestes jovens, através de um ensino superior de qualidade (sim, ainda há ensino superior de qualidade em Portugal) e de bolsas de formação avançada, tudo isto num esforço digno de registo na última década. E esta gente não é ingrata com o país, mas, graças às idiossincrasias da própria natureza, precisam de comer e ter um tecto.
Bolseiros de investigação, de doutoramento, de pós-doutoramento deparam-se hoje com atropelos à sua dignidade. Presos num contrato que exige exclusividade, são os primeiros a sofrer as consequências da instabilidade no financiamento, atrasos na gestão de processos e nas transferências de verbas para as instituições. Falta liquidez? Não faz mal, atrasam-se os pagamentos aos bolseiros e, de preferência, sem avisar. As instituições e o Governo refutam responsabilidades e, enquanto isto, estes jovens adultos e com rendas para pagar desesperam. Nada podem fazer, é a exclusividade patente no contrato que os impede de considerar qualquer outra hipótese viável e imediata de rendimento. Ninguém os ouve. Não há amor à ciência que resista assim. E não importa a justificação oficial, porque ela não serve como talão de desconto no supermercado. A responsabilidade não é de um, é de todo um sistema que falha, agora quando todos mais precisam.
E quando até há pouco o tempo os “felizardos” bolseiros podiam contar com o apoio da família para sobreviver nos meses sem bolsa; agora nem isso lhes vale. A família já não pode ajudar. Alguém lhes disse que viveram acima das suas possibilidades e por isso foram-lhes cortados salários e aumentados os impostos.
Defende-se hoje um modelo de financiamento da ciência de excelência. Não poderia estar mais de acordo. Mas na base de sustentação dessa tão almejada excelência está o trabalho científico de base, que, não sendo outstanding como gosta de se dizer, não deixa de ser fundamental. Ora esse trabalho científico fundamental é, frequentemente, suportado por bolseiros de investigação em formato de “formação avançada subsidiada”. Na realidade, esses bolseiros somam no seu currículo uma “avançada” lista de bolsas ao longo de anos, espaçadas por meses em que nada recebem enquanto esperam pelo início de um qualquer novo projecto.
Este modelo de prestação de trabalho científico fundamental precisa de ser reformulado e integrado numa visão estratégica de futuro científico sustentável e sustentado em Portugal. Um desafio para a ciência portuguesa e, reconhecendo dificuldades que o país enfrenta, é o de não confundir excelência com elite. É que o trabalho científico de excelência não se reflecte necessariamente em publicações em revistas científicas internacionais.
Por outras palavras, há ciência de excelência que escapa na malha dos indicadores científicos tradicionais utilizados pelos painéis de avaliação. A cegueira do publish or perish (publica ou desapareces, numa tradução livre), se desenraizada da especificidade de cada ramo da ciência, conduzirá à extinção de áreas da ciência fundamentais para o desenvolvimento do país. A consequência é a já visível fuga para outros países de toda uma geração de gente qualificada. Outros países, como a Alemanha, agradecem.
Os números da OCDE indicam um acréscimo de emigração por parte de portugueses com formação superior. A OCDE suspeita ainda de que os dados sobre Portugal como país de origem estejam subestimados relativamente ao fluxo real de emigração. No caso dos jovens investigadores, não custa imaginar porquê. Como se contabiliza a emigração de cientistas em regimes precários? Como pode o país contabilizar a fuga destes cérebros? Assim de repente, contabilizo 7 jovens em fuga nos últimos 2 anos só no meu pequeno grupo de colegas que não ultrapassa a vintena.
Imersa nestes pensamentos, ouço a canção Boa Sorte (Vanessa da Mata/Ben Harper). Nunca como hoje a letra fez tanto sentido para mim, fala de uma despedida entre gente jovem e capaz e do seu país que já mais não os pode segurar. “É só isso / não tem mais jeito / acabou, boa sorte (…) / tudo o que quer de mim / irreais / expectativas / desleais(…).”
*Geóloga do Centro de Recursos Minerais, Mineralogia e Cristalografia da Universidade de Lisboa
Vanessa da Mata & Ben Harper - Boa Sorte (Good Luck)


Ecos da blogosfera – 14 dez.

E quem fica com o poder? Obviamente: a Alemanha!

Após 14 horas de discussões, os ministros europeus das Finanças chegaram a um acordo sobre um sistema de supervisão bancária. O projeto abrange apenas uma minoria dos estabelecimentos, mas simboliza um progresso para a saída da crise, estima a imprensa europeia.
“A Europa vai finalmente controlar os seus bancos”, congratula-se Le Monde, após a assinatura do acordo pelos ministros das Finanças da UE, na madrugada de 13 de dezembro. “Houve um acordo unânime e histórico sobre a supervisão dos bancos europeus a partir de 2014”: o texto prevê a supervisão direta do Banco Central Europeu “sobre instituições que tenham mais de 30 mil milhões em ativos, que pesem mais de 20% do PIB do país de origem ou que beneficiem de apoios europeus”, esclarece o jornal. Isto implica 150 a 200 bancos, dos 6.000 instalados na União Europeia.
No seu editorial, o jornal saúda “o grande salto em frente da união bancária, que procura inviabilizar, não a guerra, mas a morte do euro”:
Quando os bancos espanhóis ameaçaram falência, na primavera de 2012, a ideia de uma união bancária impôs-se: para se salvarem a si próprios, os europeus poupados pela crise tinham de salvar diretamente as instituições falidas. Os alemães exigiram, com razão, uma análise prévia aos bancos pelo BCE. Essa primeira etapa acaba de ser ultrapassada. [...] A supervisão é apenas um preliminar, que deve ser acompanhado de um mecanismo europeu de gestão de crises e recuperação. [...] A garantia dos depósitos europeus [seria] a coroação da união bancária. Sendo desejável, foi rejeitada por Berlim. Tornou-se longínqua, tão longínqua como a União Federal.
Para o chefe de Redação da BBC Europa, Gavin Hewitt, o acordo dos ministros das Finanças é “um exemplo de como, para sobreviver, a crise da zona euro forjou uma nova Europa, menos por opção do que por necessidade. A direção encetada deixa algumas pessoas desconfortáveis e não apenas na Grã-Bretanha”.
Do lado alemão, o diário económico Handelsblatt considera o acordo uma “notícia muito boa”, especialmente para os contribuintes da zona euro:
Já era tempo de destituir as autoridades nacionais de supervisão. Estão todas sob influência dos políticos que persistem em manter uma mão protetora sobre os seus bancos e, assim, evitar as necessárias medidas de saneamento. A Espanha é um exemplo disso. O Chipre também. [...] Os contribuintes alemães também se devem regozijar. O fracasso da supervisão bancária alemã custou-lhes mais do que o apoio à Grécia. Esperemos que o Banco Central [Europeu] se saia melhor. Fazer pior é difícil.
Não resta quase nada da ambiciosa ideia de conduzir a Europa para uma verdadeira união bancária, lamenta em Lisboa o Diário Económico. Segundo este,
ao longo de 2012, os líderes europeus apresentaram a ideia de uma união bancária como a verdadeira resposta sistémica à crise do euro e o embrião de uma nova união económica e política na Europa. Muitos meses volvidos, como em todas as outras respostas apresentadas para a crise, o assunto arrasta-se, a urgência foi-se, a ambição dilui-se e a adoção, a conta-gotas, do que parecia uma boa ideia não resolve a crise e arrisca-se, no curto prazo, a enfraquecer a regulação bancária.
Para El País, o acordo sobre a união bancária surge “carregado de tecnicismos, mas, na realidade, a questão é sempre a mesma: quem fica com o poder”. E a resposta é clara: a Alemanha. Após de ter conseguido retirar os bancos locais às competências do supervisor único:
A Alemanha impõe igualmente uma solução descafeinada para o fundo de garantia comum (que consistirá simplesmente em homogeneizar os fundos nacionais) e um atraso considerável nos fundos de resolução bancária (mecanismo que permite encerrar bancos, se necessário), que foi, a certa altura, uma maneira de mutualizar os problemas do euro pela porta das traseiras. E quanto à maioria dos outros assuntos, [a Alemanha] conseguiu atrasar o calendário, contra o parecer da Itália, da França e principalmente da Espanha, o país mais exposto do lado financeiro.
Independentemente de qualquer opinião ou crítica que se possa fazer (e aos cidadãos o que lhes interessa?), fica sempre a chamada dúvida metódica, que no caso tem mesmo a ver com o método, mas sobretudo com os “fiscais”.
Se em cada país, os supervisores não deram conta do recado, como irão os mesmos (são sempre os mesmos) a dar conta de uma tarefa muito maior?
Se nos lembrarmos que o vice presidente do BCE é o nosso Constâncio, que fez (ou não fez) o que se viu (ou não viu)…
Se soubermos que os restantes membros da direção do BCE são clones do nosso Constâncio, que também não fizeram nada que impedisse as falcatruas das suas instituições bancárias…
Se dos 6.000 bancos existentes na União Europeia, apenas 200 (os maiores) vão ser supervisionados…
Se antecipadamente sabemos que 5.800 vão andar à rédea solta…
O embrião ainda corre o risco de abortar…

Contramaré… 14 dez.

Para estimular a competitividade, Álvaro diz que "não podemos olhar só para os custos laborais, mas para todos os custos de produção". Mesmo porque "não ganhamos competitividade sustentada com salários baixos. E os salários em Portugal são baixos". Então como podem crescer? "Fazendo crescer a produtividade e a economia, apostando em medidas como o ensino técnico, a qualificação."

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

A que órgão de soberania nacional pertence o Abebe?

O chefe de missão do FMI deu uma palestra na Ordem dos Economistas, onde falou sobre a situação económica de Portugal no passado, no presente e no futuro.
André Cabrita Mendes
Abebe Selassie deixou várias ideias no ar, sobre como Portugal deve encarar o futuro, como a reestruturação da banca, e recomendou mesmo que deve ser feito um debate alargado em Portugal sobre qual o modelo de Estado Social que o país pretende no futuro.
As 10 ideias de Abebe Selassie sobre a economia portuguesa
Reestruturação da banca"Os bancos precisam de mudar o seu modelo de negócios se quiserem evitar mais um ciclo de elevada alavancagem", afirmou Abebe Selassie. Para o responsável, os custos das operações dos bancos são elevados e é “muito importante a redução de custos” para melhorar as condições de financiamento dos bancos e do próprio país.
Selassie destacou também a importância do novo mecanismo de compra de dívida do BCE, o mecanismo de transações monetárias definitivas (OMT, na sigla em inglês) para corrigir a ineficiente transmissão monetária na moeda única. "É muito claro que o mecanismo de transmissão monetária não está a funcionar como devia. Isto é algo que precisa de mudanças de política da zona euro", afirmou.
Estado social"Se quiserem ter um grande estado providência em Portugal, tudo bem, mas têm de saber como pagar por ele", afirmou o economista. Selassie considera que é preciso fazer um debate alargado em Portugal sobre esta questão: "É possível ter um Estado baseado no modelo escandinavo, mas para isso é necessário um setor exportador muito dinâmico. Esse é um debate necessário."
Ineficiências no sector público – Abebe Selassie considera que ainda existe "margem para reduzir as ineficiências no setor público". E exemplificou com os gastos com pensões, que afirmou estar “entre os mais elevados na zona euro, cerca de 15% do PIB". O grande problema aqui, sublinhou, é que embora Portugal seja dos países que proporcionalmente mais gasta em pensões, também é um dos que tem maior risco de pobreza entre idosos.
Aumento da dívida pública deve-se à reclassificação de PPP e empresas públicas - O homem forte do FMI em Portugal considera que é errado atribuir o crescimento da dívida pública à crise, porque estas devem-se à entrada das despesas das PPP e das empresas públicas nas contas do Estado.
"Uma das coisas que as pessoas nos dizem é que o crescimento da dívida pública é um resultado da crise. Acho que é uma visão errada, porque a política orçamental foi expansionista, mas também porque muita da despesa que fizeram com Parcerias Público-Privadas e empresas públicas, entrou nas contas públicas. Grande parte do aumento da dívida pública deve-se à reclassificação destas entidades em contas nacionais", disse hoje.
Portugal não é a Grécia - "Acho que nesta conjuntura não se querem comparar com a Grécia", defendeu Selassie. Para o responsável do Fundo, os progressos do país estão a ter resultados visíveis com a queda dos custos de financiamento e que será melhor para Portugal continuar a avançar com o programa e evitar associações com a Grécia, devido à possibilidade que foi avançada de Lisboa beneficiar das novas condições para Atenas concedidas pelo Eurogrupo.
Dívida pública e privada - Abebe Selassie criticou duramente tanto o endividamento do Estado como o endividamento dos privados. "A política orçamental foi completamente indisciplinada", acusou o responsável, que também criticou o sector privado. "Um fator distintivo de Portugal era a elevada alavancagem do setor privado, algo que foi alimentado por mercados internacionais e bancos domésticos complacentes", sentenciou.
Programa da troika começa a dar resultados em 2013 - O chefe de missão do FMI mostrou-se bastante otimista quando falou sobre os resultados do ajustamento orçamental que está a ser efetuado em Portugal. Abebe Selassie disse que muitos dos resultados do programa só serão visíveis no médio e no longo prazo, devido às reformas estruturais em curso.
O economista apontou que Portugal deverá voltar ao crescimento "na segunda metade do próximo ano" mas sublinhou que este está dependente da evolução dos mercados internos.
Portugal não se adaptou às transformações globais - "Portugal, no essencial, não soube adaptar-se a estas transformações", sublinhou hoje Selassie. Assim, o responsável do FMI considera que as políticas públicas nacionais "não foram capazes de responder a desenvolvimentos" como a globalização e a entrada da China nos mercados globais, a revolução das tecnologias digitais, a criação do euro e a crise financeira global.
Sacrifícios não foram em vão - "Reconhecemos que há um grande aumento do desemprego, que duplicou. Há uma grande pressão sobre as famílias. Mas o esforço não foi em vão", defendeu hoje o etíope. Os portugueses "fizeram sacrifícios consideráveis até agora, evidentemente, mas conseguimos grandes progressos", afirmou, considerando que houve uma redução dos "desequilíbrios macroeconómicos que caracterizavam" a economia portuguesa, como a redução das taxas de juros sobre a dívida soberana, a redução do défice externo e o equilíbrio orçamental.
Impacto negativo do programa - Abebe Selassie admitiu que a consolidação orçamental continua a ter um "um efeito negativo superior ao previsto" sobre a economia e que o desendividamento das empresas pode vir a ter um "impacto ainda maior sobre o emprego".
Sobre o recente estudo do FMI, que demonstrava que os efeitos recessivos das políticas de austeridade são superiores ao inicialmente previsto, Selassie esclareceu que o estudo já foi incorporado na 5ª revisão do programa português, mas avisou que é preciso ler o documento com atenção. "É preciso muito cuidado para interpretar esses resultados, que não se aplicam necessariamente a situações específicas de países."
Constança Cunha e Sá criticou, a atitude do chefe da missão do FMI na troika, que em sucessivas entrevistas e conferências de imprensa tem manifestado opiniões sobre Portugal. A comentadora aconselhou mesmo o senhor Abebe Selassie a “calar-se”. “Eu pergunto, como o rei Juan Carlos perguntava ao Hugo Chávez: Porque não te calas?”, afirmou.
Para a comentadora, “não é possível, nem é normal, que haja um chefe de missão que esteja constantemente a explicar ao Governo e aos portugueses como é que devem ser governados”.
“Eu penso que uma coisa é o aconselhamento do FMI e o facto de o FMI estar na troika, outra coisa é um senhor, que não passa de um técnico, estar todos os dias nas televisões a explicar ao país, ao Governo e aos portugueses como é que devem ser governados. Se o mais difícil está para vir ou não deve estar, se já foram feitos 2/3 da consolidação e ainda falta 1/3, que temos de prosseguir nas políticas sociais, etc.”, sublinhou.
“Mas quem é este senhor?! Não há ministros para falar aos país sobre estas questões? É preciso ser um técnico do FMI para vir explicar dia sim, dia não, aos portugueses o que é que o Governo e o país vão ter que fazer?”, questionou ainda Constança Cunha e Sá.
“Nós não precisamos do senhor Selassie para nos explicar isso. Para isso, há um relatório anual do FMI sobre Portugal em que se diz que o desemprego vai subir e que o crescimento económico é uma miragem que há-de aparecer na melhor das hipóteses em 2015”, rematou.
Pronto! Poupei-me a ter de fazer uma análise (repetida) mais pormenorizada, porque já cansa ouvir este estrangeiro repetir o que Gaspar e Passos se fartam de antecipar e que demonstra que afinal repetem, subservientemente, o que o Selassie lhes diz… E fica provado que as avaliações classificadas de “Excelentes” são dadas na razão inversa dos resultados, ou quando muito “a olho”, porque continua a haver muitos mas… e a vida dos portugueses a piorar com tanto sucesso.
E fica ainda a certeza de que os tecnocratas, no fundo, no fundo, são políticos de 1ª, nos países dos outros…

Ecos da blogosfera – 13 dez.

União Europeia - Prémio Nobel da PAZ - V

Só pelo Erasmus, o seu programa de intercâmbio de estudantes, a UE merece o Nobel, por ter fomentado o amor físico transnacional e a criação de verdadeiros europeus.
Uma das críticas que ouvi à decisão do comité Nobel de atribuir o prémio à UE foi que tinha sido um pouco como um Óscar pela carreira de uma vida: com pelo menos 20 anos de atraso e apenas concedido por causa da morte iminente do laureado. Tirando a imprensa britânica de centro-direita, que pensa que a decisão do comité é "ridícula" e uma tardia "piada do primeiro de abril", foi esta a linha adotada por muitos dos principais órgãos de comunicação europeus.
A crítica parece sensata mas, pessoalmente, penso que é um disparate. O consenso pode ser agora ver o Nobel como um prémio pelas realizações do passado, mas há razões muito mais fortes para o encarar – como no caso de Obama em 2009 – como um prémio pelo potencial do futuro. Se só pudesse usar uma palavra para explicar porquê, diria Erasmus.
O Erasmus é um programa de intercâmbio da União Europeia criado em 1987, que é muito popular no continente mas que praticamente não é referido nas secções de negócios que geralmente se ocupam da cobertura dos assuntos europeus no Reino Unido. Mais de 2,5 milhões de estudantes de toda a Europa participaram nele desde o seu lançamento. O Reino Unido é um dos destinos mais populares mas um dos participantes menos ativos, tendo em conta a sua dimensão: no ano académico 2009/2010, o Reino Unido acolheu 22 650 estudantes estrangeiros, no âmbito do sistema de intercâmbio do Erasmus, e mandou para o estrangeiro apenas 11 723.
Há muitas pessoas que partiram no quadro do sistema de intercâmbio e nunca voltaram. Alemães que se apaixonaram por espanholas, mulheres gregas que acabaram por casar com franceses, polacos que têm filhos de mães portuguesas. No ano passado, o romancista italiano Umberto Eco disse que "o Erasmus criou a primeira geração de jovens europeus". Eco chama ao processo "uma revolução sexual: um jovem catalão conhece uma rapariga flamenga – apaixonam-se, casam e tornam-se europeus, tal como os seus filhos".
Nobel da Paz para união sexual da Europa
Pessoalmente, não consigo imaginar que estes pais e os respetivos filhos sejam capazes de escutar os apelos à guerra de um demagogo nacionalista e ouvir em silêncio. Dirão qualquer coisa. E mais importante ainda: nos próximos 20 anos, alguns deles talvez se tornem figuras proeminentes nos órgãos de comunicação, no mundo empresarial e na política e pensarão cada vez mais para além das fronteiras nacionais. Se for superada – e é um sério se – há fortes possibilidades de a crise da zona euro ser seguida por um período de paz tão longo que os últimos 67 anos parecerão curtos, em comparação.
Os eurocéticos britânicos dirão que o amor físico transfronteiras foi obra, não de burocratas cinzentos da UE, mas do comércio livre entre Estados-nação. Mas quem é que se apaixona numa reunião de negócios? A beleza de um sistema como o Erasmus é que permite o encontro de jovens, antes de estes começarem a encarar esses encontros apenas como meios para uma troca de capital, antes de estes ostentarem a fria máscara do comércio.
E, seja como for, quem pode dizer que o prémio não deve ser romântico? Se acreditarmos realmente que nada garante mais eficazmente a harmonia intelectual do que o comércio livre, então bem se poderia entregar o Prémio Nobel da Paz a Ronald McDonald. Isso motivaria verdadeiramente o continente.
Até agora, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, tem-se recusado a confirmar como será gasto o dinheiro do prémio. Uma vez que a Espanha vai reduzir drasticamente a sua contribuição para o Erasmus, por falta de fundos, os €923 680 para alargar o programa – não apenas a estudantes, mas também a "motoristas de táxi, canalizadores e outros trabalhadores", como sugeriu Umberto Eco – corresponderia, finalmente, ao envio de um sinal positivo de Bruxelas.
Um Prémio Nobel da Paz para a união sexual da Europa – seria qualquer coisa que poderia deixar-nos a todos genuinamente entusiasmados.

A Europa da Banca, antes da União dos depositantes…

A união bancária já foi adiada durante mais de 10 anos, mas há indícios de que a situação poderá mudar com a próxima cimeira da UE, esta quinta-feira. É evidente que os interesses nacionais de certos Estados-membros prevalecerão sobre o bem comum, lamenta o colunista do jornal Polityka.
Seja qual for a decisão tomada pelos líderes da UE na cimeira desta quinta-feira, não será certamente a união bancária de que se falou nos últimos meses.
Deveria ser constituída por 4 elementos: uma supervisão bancária integrada, um sistema de garantia dos depósitos e de resolução de crises bancárias e um quadro regulamentar comum dos bancos supranacionais.
No melhor dos casos, o primeiro elemento mencionado será o único a ser aplicado. E mesmo que a supervisão bancária europeia seja introduzida, seria exagerado designá-la por “união”.
Oportunidade perdida
A união bancária deveria ter ocorrido há 10 ou 15 anos atrás. De facto, há muito que temos o equivalente de um mercado financeiro único – os bancos europeus operam de forma transnacional, os investidores compram obrigações dos países vizinhos, os cidadãos abrem contas noutros Estados-membros – a única coisa que se mantém nacional é a supervisão financeira.
Por consequência, os maiores bancos são menos controlados na Europa do que nos Estados Unidos; pior ainda, a UE não tem regulamentos de proteção similares ao Capítulo 11 [que permite às empresas se reorganizarem caso] entrem em falência.
Uma vez mais, os interesses nacionais impedem uma maior união. A Alemanha não quer que a supervisão bancária única interfira com os seus Sparkassen [bancos de poupança regionais]. A França gostaria de evitar as regulamentações comuns, nomeadamente em matéria de fundos próprios.
A Holanda não quer financiar o sistema de garantia dos depósitos. Mas o maior opositor a esta união bancária é o Reino Unido, que teme um ataque mortífero à City, o centro financeiro da Europa e o principal motor da economia britânica. David Cameron participará na cimeira e tenciona fazer uso do seu veto.
União bancária da zona euro
A união bancária deveria marcar o início da recuperação da economia europeia. Em vez disso, preparamo-nos para assistir a mais uma cimeira de impotência política – esta deverá ser ainda mais humilhante, na medida em que acontecerá pouco depois de os membros da EU receberem o prémio Nobel da Paz em Oslo.
Mas o facto de os Estados-membros não chegarem a um consenso terá uma consequência muito específica: os países da zona euro implementarão a sua supervisão bancária.
Caso a cimeira acabe num fiasco, 18 dos 27 Estados-membros receberão um mandato claro para desenvolver uma maior integração entre eles. Já foi apresentada a proposta de um orçamento da zona euro à parte.
Negociações - Suécia e República Checa podem ficar de fora
A Suécia, a segunda maior praça financeira na zona euro, deverá juntar-se à Inglaterra e manter-se fora da união bancária europeia, porque considera que os membros que não fazem parte da zona euro terão direitos muito limitados. “A Inglaterra consegue assim um aliado fiel que também defende que o Banco Central Europeu não conquistará uma posição dominante ao definir as regras técnicas da UE, quando este se tornar responsável pela supervisão”, escreve o Financial Times.
O Governo checo também ameaça vetar os planos da união bancária uma vez que se opõe à supervisão dos bancos por parte do BCE. Muitos bancos checos são filiais de bancos da zona euro, e o primeiro-ministro Petr Nečas quer evitar que o sistema bancário checo se transforme num prémio para os credores da zona euro. “A UE deve aceitar a declaração especial proposta pelos checos, caso contrário não haverá união bancária”, observa o diário económico Hospodářské noviny.

Contramaré… 13 dez.

“A mensagem é que não se corte demasiado ao nível das prestações e transferências sociais para as famílias, de forma a suavizar o impacto da envolvente macroeconómica que é negativa neste momento, mesmo que isso acarrete um peso acrescido sobre o orçamento pelo lado da despesa”, afirmou João Tovar Jalles, economista na OCDE responsável por Portugal.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Previsões? Só quando reouvermos as notas roubadas!

A zona euro registou uma queda da sua atividade de 0,1% do PIB no 3º trimestre, depois de ter registado um retrocesso de 0,2% no trimestre anterior, confirmou o Eurostat. Isto confirma, que o conjunto dos 17 países da zona euro está em recessão, já que os técnicos consideram que um período de recessão se dá quando são registados 2 trimestres consecutivos de queda do PIB.
Mais uma vez, os dados mostram os grandes desequilíbrios da zona euro: Espanha (-0,3%), Portugal (-0,8%) e Itália (-0,2%) continuam mergulhadas na recessão, enquanto a Alemanha (+0,2%) e a França (+0,2%) resistem aos embates da crise da dívida.
O BCE reduziu claramente as suas previsões de crescimento na Eurozona, cujo PIB cairá 0,5% em 2012 (-0,4% na previsão anterior) e retrocederá 0,3% em 2013, invertendo um prognóstico anterior de crescimento positivo (+0,5%) para o próximo ano.
Para 2014, o BCE espera um crescimento de 1,2%, segundo uma primeira estimativa. Por sua vez, o BCE confirmou a sua previsão de inflação para 2012 (2,5%), e previu 1,6% em 2013 e 1,4% em 2014.
Queda do PIB em 3,5% no 3º trimestre do ano é pior do que previsto pelo próprio INE, as exportações continuam em desaceleração e o emprego em queda. Mas Passos Coelho insiste em falar em “bons resultados”.
O PIB da Grécia acelerou a queda a 6,9% no 3º trimestre de 2012, de acordo com dados anuais da Autoridade de Estatísticas Gregas.
A queda aconteceu após um retrocesso de 6,3% do PIB grego no 2º trimestre e de 6,7% entre janeiro e março.
O país prevê no orçamento de austeridade para 2013 o 6º ano consecutivo de recessão, com uma baixa de 4,5% do PIB, após uma queda de 6,5% esperada para 2012.
No relatório semestral, o Banco da Grécia destacou esta semana que a recessão acumulada entre 2008 e 2013 pode alcançar 24% do PIB.
A Grécia, com uma dívida colossal, está submetida a uma drástica política económica de ajuste e austeridade, em troca de um plano de ajuda financeira internacional
O que quer dizer que já estamos em recessão há muito mais de 2 trimestres consecutivos e sempre pior, realidade que não pode ser desmentida e que encoraja alguns iluminados a dizer que estamos no bom caminho (do precipício)…
Saliente-se (sempre) que as coisas estão muito pior na Eurozona, embora digam os iluminados que o Euro não tem nada a ver com a maleita…
Quem se vai safando (por enquanto) é a França e a Alemanha, que apesar de, vão andando em frente, pé ante pé, sorvendo o mal de uns, que é o bem de outros, enquanto nós vamos dando passos atrás (mais passos do que Passos prometeu)...
Como cá, até os eficientes técnicos do BCE (onde Gaspar fez o “estágio”) se enganam nas previsões, e de que maneira, confirmando o que o Eurostat registou, mas também como cá se promete uma inversão para o crescimento em 2013, mas só se o fim do mundo se confirmar no próximo dia 21…
Entretanto, PPC (um dos que acredita no fim do mundo) insiste nos “bons resultados” (podia ser muito pior), mesmo com o PIB a cair 3,5%, pior do que o previsto pelo próprio INE (também tem direito a palpites), mesmo com as exportações a diminuírem (acabou o ouro usado) e mesmo com o emprego sempre a aumentar. E só por isso é que os resultados são bons para o “nosso” Primeiro, se pretende que o PIB baixe, as exportações diminuam e o desemprego aumente…
Tendo em conta a realidade grega, que vai 1 ano à nossa frente e da Irlanda, já sabemos qual vai ser o nosso PIB em 2013, as exportações e o desemprego, se for verdade que as mesmas causas provocam os mesmos efeitos…
Perante tudo isto, o que preveem (seja quem for a prever) e com o que nos acenam como futuro menos tristonho, até dá tristeza, por sabermos, comprovadamente, da incompetência destes engajados “tecnocratas”, travestidos de cartomantes…
Até quando e até onde vai o limite da nossa paciência?
Admirável “mundo novo” com truques velhos!