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sábado, 29 de dezembro de 2012

A ANA vendeu-se, a AdP vai por água abaixo e nós?

No final de Setembro, o défice das administrações públicas terá ficado nos 6,1% do PIB, revelam as contas dos técnicos do Parlamento, que concluem que a meta do Governo de conseguir um défice de 5% para o conjunto do ano "afigura-se extraordinariamente difícil de alcançar".
Nem mesmo as receitas da concessão da ANA chegarão para Portugal cumprir a meta acordada com a ‘troika'. Os cálculos da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) apontam para um défice entre 5,9% e 6,3% no final de 3.º trimestre, em contabilidade nacional. O número final só será divulgado pelo INE a 28 de Dezembro.

A privatização dos sectores das águas e resíduos deu na quinta-feira um importante passo com a aprovação, em Conselho de Ministros, de uma proposta de lei que permite o acesso dos privados aos sistemas multimunicipais. A privatização da Empresa Geral de Fomento (EGF), a empresa pública que gere os resíduos no universo Águas de Portugal, com conclusão prevista para o 1.º semestre do próximo ano, fica mais perto.
Segundo informações que têm vindo a público, já há interessados nesta privatização – o presidente da Águas de Portugal chegou a avançar que seriam uma dezena de empresas, não as identificando mas dizendo tratar-se de entidades portuguesas, espanholas, francesas, chinesas e brasileiras. A privatização poderá render aos cofres públicos 150 a 180 milhões de euros. 
Neste último Conselho de Ministros de 2012, foi também aprovada a proposta de lei orgânica da Entidade Reguladora de Águas e Resíduos (ERSAR), considerada pelo Governo como “o ponto de partida para a reestruturação do sector da água e resíduos" em 2013. A proposta dá maior autonomia e novos poderes ao regulador, que passa a poder fixar tarifas e aplicar sanções pecuniárias. Cria-se também um novo órgão, o conselho tarifário.
Pelo que nos informam, o défice previsto (mais uma “previsão” furada) vai além da crença do Gaspar e dos resultados da sua folha de Excel.
E para “salvar a face”, lá tiveram que prostituir a ANA, privatizando-a, e como a mercadoria era boa, lá conseguiram umas massas, que podem permitir fazer de conta que reduziremos o défice até à “previsão”, se a Eurostat deixar contabilizar o apuro conseguido, o que acontecerá, para dar um aval ao governo, à troika e sobretudo à estratégia de ambos, que se traduz em vender alguns anéis, entre outras imoralidades.
É fácil perceber-se, que para o ano, com “previsões” ainda mais arriscadas e seguramente mais falíveis, mais difícil será reduzir ainda o défice para valor mais baixo, que nem mesmo o novo saque feito através dos impostos ajudará, o que só será possível com a prostituição de outra mercadoria boa, mas o que nos resta já é só a Águas de Portugal (a RTP é só para o DOTOR brincar aos berlindes), cuja privatização foi adida para 2013. É fácil perceber-se, que lá para o fim do ano que está a chegar, iremos, mais uma vez, ao saco das joias, esvaziá-lo…
Para tanto, o governo já vai preparando o terreno, sabendo que há interessados dispostos a “correrem riscos” em benefício do interesse nacional, embora com a garantia de que os lucros são certinhos, apesar de os resíduos virem a reduzir (obviamente) e começar a haver concorrência com os “catadores” de lixo, que farão a separação seletiva do que for comestível, se não houver legislação que proíba esta atividade paralela…
E em 2014? Talvez a TAP… Não esquecer que em 2015 haverá eleições (se entretanto o povo não quiser exercer o seu direito soberano de escolher novos governantes) e o saco azul estará vazio, restando apenas umas tantas mentiras para enganar os incautos (esperemos que o povo tenha aberto os olhos e muitos já os tenham fechado) para novos assaltos ao património pessoal, como nos regimes ditatoriais, de esquerda ou de direita…
E nos anos seguintes?
É pena não poderem privatizar o fabrico do pão, ficando garantido na Constituição (as privatizações são para isso) o assistencialismo privado, com os dois alimentos mais básicos e suficientes para a sobrevivência, passando “os mais desfavorecidos" a viver “a pão e água” e à luz de velas…
Não haverá procura (privada) para o mercado de dedos?

Ecos da blogosfera – 29 dez.

A imprensa na Europa (hoje) - 3/5

A era da Internet multiplicou as promessas: íamos todos ser autores, jornalistas ou editoras, e íamos todos ganhar dinheiro. No entanto, a democratização da informação nunca chegou a acontecer, constata o chefe de redação do jornal FAZ. Excertos.
Não soubemos aproveitar esta aurora cheia de promessas! Todos tinham na secretária ou no bolso aparelhos que lhes ofereciam meios de comunicação que nem o Presidente dos Estados Unidos possuía, isto há 20 anos; não eram precisos grandes investimentos para se formar um estúdio de televisão ou uma editora: tudo era possível, diziam todos exaltados, mas não agarrámos a oportunidade. Um desastre, sejamos sinceros, onde a mensagem de um sonho nos faz refletir, agora que estamos despertos.
O que aqui está em causa não é a crise da imprensa. Quando vemos a grande máquina mediática reagir de forma automática e crítica – nem sempre com más intenções, mas dando sempre lições – às “ocasiões falhadas” [do setor] após os anúncios de insolvência do Frankfurter Rundschau e do encerramento do Financial Times Deutschland, é sinal que está na hora de ver quem está no barco.
O iPhone ou o futuro social
Arredondemos os números para os que adormeceram: 10 anos de comércio eletrónico, 10 anos de economia da informação, 5 anos de smartphones aos quais se juntam pelo menos 20 anos de ideologia, elaborada pelos intelectuais da Web, isto é a autonomização de todos os cidadãos enquanto voz da opinião pública, e da participação individual.
Para onde foi toda esta euforia dos primeiros tempos? O que é que ainda é verdade nestas teorias sobre uma tecnologia que devia abalar as relações sociais e económicas – estaremos perante o maior golpe de marketing da história, orquestrado por Silicon Valley?
80.000.000 de alemães pensaram que se tornariam de um dia para outro a sua própria editora, autora e impressora: onde está o novo Pulitzer? Onde estão os modelos de blogue, de startup ou de comunicação que funcionam pelo menos minimamente na Web?
Se há cada vez mais pessoas a desejar o desaparecimento dos órgãos de comunicação social chamados “tradicionais”, talvez se deva ao facto de alguns considerarem que a única forma de serem bem-sucedidos é livrando-se da concorrência. “Que comam o futuro!”, eis a resposta do célebre ensaísta americano Thomas Frank a esta estratégia – por outras palavras: devemos partir do princípio de que cada nova geração de iPhone contém o programa do futuro social.
A exploração de si próprio
Não há ninguém que goste mais de brincar ao determinismo tecnológico do que os jornalistas. Wolfgang Blau, por exemplo, diretor do site do Zeit – que nunca lucrou um único cêntimo, mas que vive graças à notoriedade do jornal, cuja estabilidade financeira é constantemente colocada em causa – surge hoje como a encarnação do pensamento neoliberal: foi esta a decisão do mercado, somos obrigados a lidar com o desaparecimento de diversos setores económicos.
A tábua de salvação está pronta: hoje em dia, um site especializado na economia dos meios de comunicação social não tem nada a dizer contra o facto de os fabricantes de bens de consumo lançarem os seus próprios sites de informação – o que permite pelo menos identificar os conflitos de interesses. Ficamos contentes por ouvir a Apple falar das condições de trabalho na China ou a Coca-Cola evocar os benefícios da mundialização.
A verdade é que, na sua versão alfa atual, o único resultado que a economia da informação teve foi a emergência de líderes industriais e de um fenómeno de concentração que, cada vez mais, faz com que o indivíduo seja o seu próprio explorador. A “ideologia californiana” anunciada há já alguns anos por Kevin Kelly – padroeiro de Silicon Valley [fundador da revista Wired] – disfarça o regresso do neoliberalismo escondido atrás da utopia tecnológica.
A predição de Kevin Kelly, segundo a qual cada um de nós tem direito a 15 megabytes de celebridade e pode obter receitas publicitárias generosas sem sair de casa tornou-se apenas realidade para um grupo restrito de pessoas no mundo. O exemplo mais marcante é o projeto do site da milionária Ariana Huffington o HuffingtonPost, que foi comprado pela AOL e que é conhecido por não remunerar os seus autores.
O que nos trouxe a nova economia da informação se não permitiu a criação de novos meios de comunicação? Gigantes do setor, que eliminam obras dos leitores de livros eletrónicos sem autorização (Amazon), censuram os títulos de certas obras ou o conteúdo do histórico (Apple, Facebook), ou destacam os seus próprios produtos nos resultados de pesquisa, uma vez que se consideram também um meio de comunicação (Google).
Redefinição das normas culturais
O novo livro de Naomi Wolf: Vagina: a new biography tornou-se “Vagina” na loja online de livros eletrónicos da Apple e foi preciso o caso provocar uma tempestade para a Apple voltar a colocar o título original. Evgeny Morozov citou este exemplo e outros no New York Times, chamando a atenção para o facto de os gigantes da informação estarem a redefinir as normas culturais de forma autoritária e, na maioria das vezes, sem ninguém dar por ela.
Continuamos à espera do desenvolvimento político e social do cidadão, que teria acesso a toda a informação com um simples clique, anunciado por Silicon Valley. A participação do cidadão limita-se cada vez mais a recomendar um conteúdo e exprimir o seu estado de espírito através de um “gosto”.
Demonstrar, como o fez Robert S. Eshelman na revista The Baffler, que a Primavera Árabe não foi provocada pelo Twitter e o Facebook, mas por sindicatos que se organizavam há anos em segredo, não constitui uma ofensa aos smartphones ou ao Facebook. Este tipo de demonstração procura mais saber como o jornalismo internacional chegou a esta conclusão – e por que lhe custa tanto refletir sobre a declaração do antigo diretor da Google no Egito, Wael Ghonim, que explicou que “a classe operária egípcia não foi contactada pela Internet nem pelo Facebook”: “As redes sociais desempenharam um papel importante, é verdade. Mas esta revolução não foi uma ciber-revolução”.
Todos no mesmo barco
Seja online ou em suporte de papel, os jornais que deixaram de interessar os leitores não podem culpar mais ninguém a não ser eles mesmos. Mas alguma vez aconteceu o contrário? Será que a Alemanha do século XXI se preocupa realmente com o facto de não poder tocar no que se lê? Todos sabemos que, num mundo sem papel, um jornal em suporte de papel torna-se automaticamente um nicho de mercado.
Como se fosse esta a questão. Como se não se tratasse sobretudo de saber se os jornalistas pretendem resistir à tentação de um fenómeno viral ou, pelo contrário, continuar a aparecer como as caricaturas de um setor que transformou a sua própria crise num título sensacionalista. Como se não existisse verdadeiramente uma diferença ontológica entre os bloguistas e os jornalistas, por exemplo, e não apenas divergências individuais; e como se não estivessem todos no mesmo barco. Uma coisa é certa: os jornais devem transmitir informações que suscitam o intelecto do leitor, e é nesta área que têm mais coisas a aprender.
O semanário Die Zeit questiona-se “como consegue sobreviver o jornalismo de qualidade”. No entanto, não é essa a questão. Num mundo onde se sabe quem mais beneficiaria com o fim do debate público, a questão chave que se coloca é: poderá uma sociedade sobreviver sem jornalismo de qualidade? Numa altura em que há cada vez mais jornalistas a seguir as previsões sociais de Silicon Valley e de Wall Street, podemos responder sem grandes rodeios e simplesmente: de forma alguma.

Contramaré… 29 dez.

As insolvências voltaram a bater recordes este ano, tendo praticamente alcançado a fasquia das 19.000, com uma subida de 62% face a 2011.
As insolvências sofreram um primeiro grande impulso há 3 anos, mas nessa altura ainda eram as empresas que mais contribuíam para o avolumar de casos nos tribunais. A partir de 2010, a tendência inverteu-se e os particulares assumiram as rédeas na escalada das falências em Portugal. Até que, no ano seguinte, passaram a representar mais de 50% dos processos, quando em 2008 pesavam apenas 22%.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Tanto saque em troca de UM natal "melhor" no futuro?

Senhor primeiro-ministro Pedro Passos Coelho,
Confesso que não o pretendia incomodar nesta altura festiva. Estava mais virado para falar da pouca-vergonha do BPN depois de, na passada semana, ter visto a reportagem da SIC com assinatura de Pedro Coelho. Um excelente trabalho que revelou que os portugueses vão ter de pagar, além dos 3.000 milhões que já voaram dos seus bolsos, mais entre 5.000 e 7.000 milhões de euros pelas fraudes cometidas por alguns no interior do banco, com culpa também dos que, fora dele, como os responsáveis do Banco de Portugal, andaram distraídos tempo de mais.
Só que, entretanto, vossa excelência resolveu escrever uma missiva aos portugueses, entre os quais eu me incluo. Já se tinha dirigido ao país no dia 25 para dizer que os sacrifícios serão transformados em breve em “novas oportunidades”, seja lá o que isso for. Não satisfeito, no dia 26 voltou a falar à rapaziada, desta vez de uma forma mais informal e através do Facebook.
Ainda pensei que a sua conta tivesse sido atacada por algum pirata informático ou que um seu assessor tivesse escrito a “facebocada” por si. Esperei um desmentido, mas nada. Pelos vistos foi mesmo o senhor primeiro-ministro que escreveu a coisa.
Depois de ler a missiva várias vezes, só me ocorreu fazer-lhe uma pergunta: Vossa excelência sabe que é o primeiro-ministro de Portugal?
É que a desgraça que traça naquela dúzia de linhas – sobre o Natal que não merecíamos, os pratos que não existiram na consoada e que estávamos habituados, as famílias separadas e as prendas que as crianças não tiveram – é, em grande parte, da sua responsabilidade.
Já se esqueceu que não tendo sido o dr. Passos Coelho a chamar a troika foi o senhor que entroikou a coisa. Quem aumentou os impostos? Quem foi o responsável pelo aumento do número de desempregados e de pobres? Quem cortou nos salários e nos subsídios depois de prometer que não o faria? Quem é que se enganou nas contas do país? Quem falhou as metas acordadas?
Foram você e o Governo por si chefiado os responsáveis por tudo isto. Não acredita? Pergunte a Paulo Portas que ele lembra-o.
Mais à frente escreve: “Já aqui estivemos antes. Já nos sentámos em mesas em que a comida esticava para chegar a todos, já demos aos nossos filhos presentes menores porque não tínhamos como dar outros.”
Vossa excelência comeu alguma coisa estragada na Consoada que lhe tirou a memória? Ainda há dias dizia que 2012 foi o pior ano desde 1974 e agora “já aqui estivemos antes”. Quando? Durante a II Grande Guerra?
Termina a “facebocada” pedindo “apenas” aos portugueses que “procurem a força para, quando olharem os vossos filhos e netos, o façam não com pesar mas com o orgulho de quem sabe que os sacrifícios que fazemos hoje, as difíceis decisões que estamos a tomar, fazemo-lo para que os nossos filhos tenham no futuro um Natal melhor”.
Há uns anos, um cronista do El País escreveu que percebeu que tinha de cortar as unhas dos pés depois de tantas vezes baixar a cabeça de vergonha ao ver um determinado programa de televisão. Foi o que me aconteceu na quarta-feira ao ler a sua mensagem. Estou a precisar de cortar as unhas dos pés.

Ecos da blogosfera – 28 dez.

A imprensa na Europa (hoje) - 2/5

A cumplicidade entre os órgãos de comunicação social e os políticos parecia maior do que nunca nos tempos do Presidente Sarkozy. Mas, em vez de pôr de lado velhos hábitos, o discreto novo chefe de Estado, François Hollande, gosta de manter os meios de informação por perto.
O principal jornal conservador do país destituiu o seu diretor editorial, aparentemente na esperança de cair nas boas graças do novo Governo. Uma revista cultural também contratou uma nova diretora editorial, escolhendo para o cargo a companheira de um recém-empossado ministro. O homem que ela substituiu foi trabalhar para o novo Presidente.
A eleição de François Hollande, o primeiro Presidente francês de esquerda em 17 anos, trouxe consigo grandes movimentações nas fileiras dos meios de comunicação social e, igualmente, uma série de potenciais conflitos de interesses.
A cobertura noticiosa também sofreu alterações. Muitos dos órgãos de informação, que na sua maioria tendem para a esquerda, costumavam deliciar-se a criticar o antecessor de Hollande, Nicolas Sarkozy, mas, agora, muitos jornalistas queixam-se de que lhes falta matéria, por causa do estilo de governação menos espetacular do novo Presidente. Dizem que Hollande se revelou espantosamente desinteressante, em especial para os órgãos de informação que por vezes fazem a cobertura do Governo como se nada mais importasse, baseando-se na política de Paris para orientar as notícias.
A linha de separação entre os políticos e os órgãos de informação é um tanto indistinta em França, onde os destinos de alguns jornalistas há muito que vão a reboque dos destinos dos membros do Governo a quem incomodam ou a quem agradam. As ligações estreitas de Sarkozy com executivos dos órgãos de comunicação foram consideradas de certo modo um escândalo e a sua presidência atraiu um exame mais profundo deste tipo de relações incestuosas.
Conflitos de interesses
Na sua campanha, Hollande assumiu o compromisso de ser "exemplar". No entanto, num país onde a maior parte da elite de Paris tem antecedentes comuns, frequentou as mesmas escolas e foi às mesmas festas, a associação tradicional de jornalistas e políticos resistiu. Daniel Carton, antigo repórter em França, acusa os órgãos de informação de não fazerem o suficiente para resistir a tais laços estreitos. "Eles sabem exatamente o que precisam de fazer para evitar que as coisas se descontrolem, mas não o fazem", disse Carton, um franco crítico dos conflitos de interesses no jornalismo francês.
Durante décadas, os jornais dependeram grandemente de subsídios estatais. Os órgãos de informação públicos, que integram talvez metade dos principais noticiários de rádio e de televisão, ainda são dirigidos por pessoas nomeadas segundo interesses políticos. Os órgãos de informação privados pertencem a empresas ou investidores com inclinações políticas ou ligações de negócios com o Estado, o que prejudica a imparcialidade jornalística.
Neste ciclo eleitoral, a história mais espantosa talvez seja a da situação de Etienne Mougeotte, cuja carreira como diretor editorial do diário de direita Le Figaro começou e terminou com a presidência de Sarkozy, o político que apoiou e de quem, disse-se, terá sido conselheiro.
"Somos um jornal de centro e de direita e apoiamos Nicolas Sarkozy", disse Mougeotte, no ano passado, ao diário de centro-esquerda Le Monde. Sob a direção de Mougeotte, Le Figaro foi regularmente criticado, por vezes pelos seus próprios repórteres, como sendo o porta-voz do Governo.
Hollande terá pedido a demissão de Mougeotte, segundo algumas notícias de órgãos de informação franceses, e esta ocorreu em julho.
O responsável pela empresa editora, Serge Dassault, é senador do partido de Sarkozy. Mas Dassault também lidera uma grande empresa da indústria aeronáutica e do armamento com contratos com o Estado, e segundo a especulação generalizada, a demissão de Mougeotte pretendeu colocar o grupo Dassault numa boa posição junto do novo Presidente.
Membros escolhidos a dedo
A revista cultural Les inRockuptibles contratou como nova diretora editorial Audrey Pulvar, figura da rádio e da televisão e companheira do ministro Arnaud Montebourg, membro destacado do Partido Socialista [renunciou, finalmente, a 21 de dezembro].
Audrey Pulvar anunciou recentemente o fim da sua relação com Montebourg, mas outras relações do mesmo género continuaram. Valérie Trierweiler, a companheira de Hollande, começou o seu caso com o atual Presidente, que conheceu num contexto profissional, em começos de 2000, quando este era membro da Assembleia Nacional. Relutantemente, neste outono, Valérie Trierweiler renunciou ao projeto de relançar a carreira jornalística na televisão mas mantém a sua coluna de crítica na revista Paris Match.
Audrey Pulvar substituiu David Kessler, que é agora conselheiro de Hollande. Por outro lado, um repórter de assuntos jurídicos da rádio Europe 1 passou a ser porta-voz do Ministério da Justiça. Um repórter político do jornal financeiro francês Les Échos faz agora parte do gabinete de imprensa do primeiro-ministro.
Os órgãos de informação públicos também passaram por mudanças pós-eleitorais. Em outubro, Hollande nomeou um novo diretor para as estações informativas internacionais de rádio e televisão, RFI e France 24. Comprometeu-se a rever a lei que lhe permitiu proceder a essa nomeação, mas só no próximo ano.
Os diretores da Radio France e da France Télévisions, ambos nomeados por Sarkozy, deverão ser substituídos. A lei atual, que institui a nomeação dos dirigentes dos órgãos de informação públicos como prerrogativa presidencial, foi introduzida por Sarkozy, em 2009. Na altura, alguns comentadores chamaram a esse medida uma tomada do poder. Sarkozy disse que a intenção era retirar uma capa de "hipocrisia" ao processo de nomeação, que era controlado por um conselho governamental cujos membros eram escolhidos a dedo.
Ansiando por mais excitação
Os órgãos de informação públicos já não servem a função de propaganda do Estado, como serviam efetivamente pelo menos até finais dos anos 1970, mas continuam sob "supervisão" do Governo, afirmou o sociólogo Jean-Marie Charon, que estuda os meios de comunicação social.
As publicações privadas estão também dependentes do Estado, pelo menos financeiramente. No ano passado, o Governo pagou-lhes €1.100 milhões em subsídios.
As publicações de esquerda lutam por "encontrar a distância certa" em relação ao Governo, adiantou Charon. A euforia que dominou a cobertura política no verão passado no Libération, Le Nouvel Observateur e Le Monde transformou-se desde então em azedume. Seja qual for a tendência dos órgãos de informação franceses, a partida de Sarkozy deixou muitos deles ansiando por mais excitação.
"Tivemos cinco anos que foram extraordinários. Tínhamos um homem que era o centro de tudo", disse Pierre Haski, cofundador e editor do site de notícias Rue89. "De repente, passámos de uma sobrecarga para uma falta de carga." E acrescentou: "Sarkozy era bom para as vendas. Hollande não é bom para as vendas."

Natal + Idade = Natalidade (em recessão mundial)

As polacas fazem cursos superiores e pensam em ser mães mais tarde, por vezes demasiado tarde. A Polónia está em boa posição para obter o 1.º lugar da classificação dos países onde já não se fazem filhos, escreve a cronista da "Polityka".
Os demógrafos calculam que, se a tendência atual se mantiver, apenas 2 em cada 3 raparigas polacas serão mães. Para já, é certo que, entre as mulheres nascidas nos anos 1970 e 1980, cerca de 1 em cada 5 não terá filhos, não sendo esse o caso de 1 mulher em cada 8, na geração dos anos 1960. Isso corresponderia a uma das taxas de natalidade mais baixas do mundo. No Japão, nos Estados Unidos ou no Reino Unido, cerca de 1 mulher em cada 4 renuncia atualmente à maternidade.
Segundo os investigadores, o prolongamento dos estudos será a principal razão desta descida da taxa de natalidade. Na Polónia, estamos precisamente em pleno boom da educação: na sua maioria, a geração dos anos 1980 e 1990 tem diplomas do ensino superior. Dos 2.500.000 de jovens com idades entre os 18 e os 22 anos, 1.900.000 prosseguem atualmente estudos universitários. O nosso mercado de trabalho, sem lei nem ordem, com os seus contratos precários e um risco elevado de desemprego entre os jovens, não ajuda nada. A idade da mãe à data de nascimento do primeiro filho aumenta constantemente, tendo chegado a mais 2 anos, ao longo dos 15 últimos anos. O número de mulheres que dão à luz o primeiro filho depois dos 30 anos duplicou.
Casais estéreis sem apoio
A evolução genética não acompanha as mudanças na sociedade. Os corpos não são concebidos para entrar na maternidade aos 30 e tal anos. Os médicos calculam que, na Polónia, 1 casal em cada 5 tem problemas de procriação. É certo que a medicina pode ajudá-los, mas o método de fecundação in vitro (FIV), o mais fiável dos últimos recursos contra os problemas de infertilidade, só era até agora acessível aos mais ricos. Recentemente, o Governo prescindiu da votação no Parlamento e aprovou, por decreto, o financiamento público da FIV, de que estão à espera 30.000 casais. Mas, sem uma lei bioética, e dada a oposição da Igreja à procriação medicamente assistida, os casais estéreis poderão ficar sem ajuda.
Algumas celibatárias diplomadas têm dificuldade em encontrar parceiros para a vida. Os estudos realizados no âmbito do programa de investigação Famwell, conduzido pelo Instituto de Demografia da Escola de Altos Estudos Comerciais de Varsóvia, mostram que perto de metade das mulheres da geração dos anos 1960 não tiveram filhos, simplesmente por não terem estabelecido uma relação suficientemente estável para constituir família. Em parte porque uma solteira com diploma não irá querer um solteiro que não o tenha, provando as estatísticas que os casais desse tipo são quase inexistentes na Polónia. Mas nem tudo é uma questão de diploma.
Um esquema tradicional abalado
Existe outro problema, que se sente sobretudo fora das grandes cidades, havendo homens celibatários que vivem parados no tempo, a meio caminho entre o passado e o presente. Como nos bons velhos tempos, continuam a achar que estão desobrigados de qualquer tarefa doméstica, mas também não querem assumir outros aspetos associados à figura tradicional masculina, ou seja, o papel de chefe de família, garante da segurança material. As mulheres celibatárias, com boa formação e cada vez mais independentes e com maior mobilidade (foram precisamente jovens mulheres que constituíram a última grande vaga de emigração polaca), já não estão dispostas a suportar um tal peso. Contudo, algumas delas não diriam que não ao esquema tradicional: ela em casa, ele no trabalho, com um bom salário no fim do mês. Mas trabalho bem pago e disponível é coisa que não há. Como queria demonstrar.
Por seu turno, as celibatárias citadinas denunciam a sobrepopulação de homens medrosos, que fogem a todas as responsabilidades e a uma relação durável. Entre os jovens a relação de casal não se mantém. Uma vez que, como nunca antes, é possível saltar, sobretudo graças à Internet, de uma exaltação para outra, por que limitar os horizontes a uma relação durável, sempre com a mesma pessoa?
Os demógrafos estimam em 7.000.000 o número de celibatários polacos com entre 25 e 45 anos. Segundo um relatório da OCDE, nada menos de 40% das pessoas com entre 25 e 35 anos vivem com os pais, mantendo quando muito uma relação informal com alguém.
Uma imagem de mãe desvalorizada
As mulheres de hoje mostram-se mais reticentes em constituir família, em parte também porque são filhas das "mães polacas" (Matka Polka – expressão que designa uma mãe disposta a todos os sacrifícios pelos filhos e pela família). Durante toda a infância, viram as mães esgotadas por acumularem 2 empregos, dentro e fora de casa. Para as mulheres da geração dos anos 1950, o casamento envolvia automaticamente a diminuição do bem-estar e uma autodepreciação do valor da própria vida. As filhas delas não querem encontrar-se na mesma situação.
Os antropologistas sublinham que o lugar da criança no mapa dos projetos, das necessidades e dos objetivos mudou inteiramente. No entanto, os psicoterapeutas dizem que um desejo de criança não realizado é uma das experiências mais difíceis da vida, que se traduz num luto em sentido literal. Mas nem toda a gente se preocupa. A ciência moderna refuta a existência de um instinto parental. E, mesmo depois de serem mães, algumas mulheres não o sentem. A não procriação está portanto incluída no desenvolvimento da civilização, ao mesmo título que o prolongamento da esperança de vida.
Mas a necessidade de ser pai pode ser enorme. Independentemente dos nossos sistemas de valores, a maior parte das pessoas deseja ter filhos, considerando que eles são a experiência essencial do amor. Uma experiência que é fonte de um sentido na vida e, afinal, o único aliado do crescimento demográfico.

Contramaré… 28 dez.

Aos défices financeiros Portugal soma défices demográficos consecutivos. Se considerarmos apenas os 6 primeiros meses de 2012, morreram quase mais 16.000 pessoas do que as que nasceram em Portugal, o que se justifica em parte devido ao pico da mortalidade verificado em Fevereiro e Março. É muito? Para alguns especialistas, é demasiado. A manter-se a tendência, será "preocupante". Em 2011, o número de funerais suplantou em cerca de 6.000 mil o total de partos, e nessa altura já soaram campainhas de alarme.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Quem não quer ser lobo não lhe vista a pele!

É difícil imaginar esta lista de presentes espalhados à volta da árvore de Natal: pistola Smith & Wesson semi-automática – custava 529 dólares (€400), agora fica por 499 dólares (€378). Ou mais vistoso: espingarda semi-automática semelhante à que Adam Lanza utilizou no massacre de Newtown – antes 1.499 dólares (€1.135), agora 1.299 dólares (€984).
Nuno Castro
Bem-vindos às promoções de Natal no Texas, estado no sul dos Estados Unidos, zona do país com maior número de proprietários de armas (54% da população, de acordo com um estudo da Gallup).
O panfleto é-nos colocado no correio, lado a lado com as revistas e cupões de desconto nos supermercados e restante comércio local. E a promoção parece dar resultado. Na Black Friday (sexta-feira após o feriado do Thanksgiving, a 22 de Novembro) os americanos correm para as lojas atrás dos tradicionais descontos em roupa, gadgets e… armas. Apenas nesse dia, venderam-se nos Estados Unidos, pelo menos, 154.873 armas – foi este o número de registos criminais pedidos ao FBI, um passo obrigatório antes de o cliente poder levar a nova compra para casa. 
Vamos então às compras. A Academy é o equivalente a um grupo como a Decathlon, mas com uma oferta ainda mais diversificada. Vende todo o tipo de artigos desportivos e armas. Ao lado dos artigos de caça, uma vitrina e uma prateleira estão repletas de pistolas, espingardas e munições. Quando o empregado se oferece para me ajudar, pergunto-lhe que arma me aconselha. “Tem experiência a disparar?” “Não. Nunca dei um tiro.”
Para novatos no mundo das armas, a primeira opção é uma pistola da marca argentina Bersa, com balas de 9 milímetros e capacidade para disparar 8 tiros seguidos. Custa 399 dólares (€302). A segunda é uma pistola bastante mais pequena. Quase parece um brinquedo. “Mas isto faz o mesmo efeito que a Bersa?” “Sim, e se disparar várias vezes de certeza que imobiliza a outra pessoa.” Passamos agora à Glock: “Uma pistola muito popular porque é muito resistente e pode sempre contar com ela.” Finalmente, a Taurus, uma pistola brasileira muito procurada porque “também dispara tiros de caçadeira”. “Tiros de caçadeira?” “Sim, é muito mais eficaz à noite, por exemplo, em que não dá para fazer pontaria e os chumbos dispersam-se para a zona onde se dispara.”
Feita a vistoria às armas, identifico-me como jornalista e digo-lhe que não estou interessado em levar nenhuma. “Mas, se quisesse, que documentos precisaria de apresentar?” Um – a carta de condução local, que se consegue ao fim de um exame de código com 30 perguntas e um teste de condução de 20 minutos.
Além disso, seria obrigado a preencher um formulário sobre os meus antecedentes criminais que depois seriam confirmados com o FBI. Mas, alertou esta semana o Brady Institute (movimento que defende mais controlo na venda de armas), cerca de 70.000 pessoas mentiram este ano ao preencher os formulários e apenas 7.000 foram acusadas criminalmente. Se quisesse transportar a arma na rua, no entanto, seria obrigado a frequentar um curso.
Antes da despedida, a pergunta da praxe sobre o negócio: “Não sei os números exactos, mas a procura está a aumentar. Depois do que aconteceu em Connecticut as pessoas estão com medo que mudem a legislação e limitem o acesso às armas, por isso estão a aproveitar agora.”
Cada vez que acontece um massacre nos EUA, como em qualquer outro lado, acontece sempre aquele ritual de flores e velas, reportagens com imagens com lágrimas e sentimentos à flor da pele, em memória… Logo depois, discute-se o problema da posse e porte de armas pessoais, mas logo depois de esquece o drama e recomeça tudo de novo, até ao próximo massacre.
Bem sabemos que nos EUA existe o lóbi das armas, que defende o negócio como se tratasse de pão para a boca (deles) e que a sua “aprovação” pelo cidadão comum é um referente cultural, fruto de séculos de violência e guerras, que não será fácil contrariar.
Há tempos, numa conferência a que assisti, perguntava-nos um intelectual brasileiro se conhecíamos algum herói americano, que não fosse militar ou ligado à guerra… Conhecem? Só os Super-Heróis e raras exceções…
Para quem vive de fora e longe dessa realidade cultural é fácil entender que ou se corta o mal pela raiz (acabando com a facilidade na obtenção de todas as armas - que matam) ou a erva daninha (psicopatas, mas mesmo gente normal em desequilíbrios circunstanciais) ganha sempre terreno e na circunstância a arma é “o melhor e único remédio”…
Não adianta chorar sobre o leite derramado, muito menos ficar à espera da rever o mesmo filme de cowboys, porque já se sabe que quem morre são sempre os inocentes, quando não, Presidentes…
Entretanto chega-nos uma boa notícia:
Celebridades americanas exigem o controlo de armas

Ecos da blogosfera – 27 dez.

A imprensa na Europa (hoje) - 1/5

Era uma história exemplar da transição democrática e a referência do jornalismo espanhol. Hoje, o diário de centro-esquerda sofre enormes prejuízos e a sua linha editorial ressente-se com isso. Uma crise que os seus administradores acentuaram, sem se importarem com as consequências. Excertos.
Quando Juan Luis Cebrián, o patrão todo-poderoso de El País, anunciou aos funcionários, em outubro, as grandes linhas do plano social que os aguardava, justificou-se com um argumento de peso: o jornal, o maior diário de Espanha, não podia “continuar a viver como até aí”. Demasiados jornalistas, demasiado bem pagos. O raciocínio recorda o de Mariano Rajoy, o primeiro-ministro (de direita), que, a cada novo plano de austeridade, explica aos espanhóis, com ar contristado, que o país não pode continuar a “viver acima das suas possibilidades”.
El País espelha em si o marasmo espanhol? A crise que atravessa o florão da imprensa de língua espanhola, propriedade do grupo de comunicação Prisa, apresenta muitos traços em comum com o colapso do país. Um endividamento gigantesco, devido a investimentos faraónicos, representantes do mundo financeiro no comando da empresa, indiferentes aos interesses específicos da imprensa, direção paga aos milhões de euros, demissões expeditas, suscetíveis de ser contraproducentes... “É uma metáfora do que está hoje a acontecer em Espanha”, comenta Miguel Mora, correspondente do jornal em Paris.
Violenta agitação interna
Quase 130 jornalistas, de um total de 466 funcionários, acabam de ser dispensados. Cerca de 1/3 dos efetivos. Entre eles, incluem-se grandes nomes do jornal. Quatro edições locais (incluindo as de Valência e Andaluzia) vão desaparecer, enquanto os jornalistas que sobreviveram ao plano de despedimentos vão ter uma redução de 15% nos ordenados.
O anúncio da ERE (sigla espanhola para Expedientes de Regulação de Emprego – que permite a execução de um despedimento coletivo) causou violenta agitação interna. Durante 3 dias, em novembro, quase todos os funcionários fizeram greve, e o jornal, que continua a ser o único diário de centro-esquerda com circulação nacional em Espanha, limitou-se a publicar os despachos das agências noticiosas. O braço de ferro entre Cebrián e o conselho de jornalistas que entretanto se formou ainda não terminou.
Em Espanha, a crise não tem poupado a informação. Quase 8.000 jornalistas foram despedidos desde novembro de 2008, segundo dados da FAPE – Federación de Asociaciones de Prensa de España. No mesmo período, encerraram 67 órgãos de comunicação, incluindo revistas. O panorama dos jornais diários é devastador: Público, jornal em papel lançado em 2008, alternativa de esquerda ao El País, entregou os pontos no início de 2012, altura em que 3 dos 4 títulos gratuitos com tiragem nacional também fecharam. Por sua vez, El País perdeu 60% das receitas de publicidade, desde 2007.
Má gestão
No entanto, há algo errado nesta análise. Olhando com atenção, El País era uma exceção no setor da imprensa. Desde a sua criação, em 1976, o título foi sempre rentável. Chegou a ter 12 milhões de euros de lucro em 2011 – mais de 800 milhões em 10 anos, até ao ano passado. Mesmo no primeiro semestre de 2012, um dos períodos mais difíceis da história recente de Espanha, o jornal manteve-se no verde – um verdadeiro milagre, tendo em conta o estado de saúde dos seus concorrentes.
A direção considera que o jornal registou as primeiras perdas em agosto de 2012. Mas esse alerta justifica, só por si, que se livrem de 1/3 dos efetivos do jornal?
“A queda de El País não é um desastre natural, mas um exemplo acabado de má gestão, capaz de arruinar até mesmo a mais sólida instituição jornalística que alguma vez existiu em Espanha. A Internet e a chamada mudança de paradigma são apenas atores muito secundários neste drama”, escreve Pere Rusiñol, ex-grande repórter principal do jornal, saído em 2008 [para ir dirigir o Público].
Delírios de grandeza
Os problemas começaram para a Prisa em 2007. Numa altura em que a crise estava prestes a estalar, o grupo foi atacado por delírios de grandeza. Lançou uma OPA sobre um canal de televisão por cabo, a Sogecable (de que já possuía uma parte). A dívida da empresa aumentou no pior momento, pouco antes do estouro da bolha em Espanha. A partir de 2008, com a Espanha a derrapar, a Prisa fixa-se numa ideia, um fio condutor no mínimo rudimentar: livrar-se dessa enorme dívida de €4,6 mil milhões.
Uma das atitudes decisivas para a atual crise foi concretizada em novembro de 2010. Nome de código: “Operação Liberty”. Nesse outono, a Prisa decidiu abrir o capital a novos acionistas, para compensar parte da dívida. Entrou-lhe então pela porta principal a financeira norte-americana Liberty Acquisition Holdings, propriedade de um punhado de investidores, incluindo um duo bem conhecido dos agentes financeiros de Wall Street: Martin Franklin e, sobretudo, Nicolas Berggruen. Entraram com 650 milhões de dinheiro fresco.
A família Polanco, historicamente proprietária de El País, detinha então 70% do capital da Prisa. Perdeu metade contra uma oferta muito vantajosa para a Liberty, que valorizou a Prisa, pelos seus mais baixos níveis históricos. “Nesse dia, a Prisa mudou para sempre: até aí, era a empresada família Polanco; depois, começou a ser devorada pelos tubarões”, escreve o jornalista Pere Rusiñol, que acaba de publicar um fantástico estudo sobre o grupo Prisa na revista [satírica] Mongólia.
2 anos após a operação Liberty, o que aconteceu? O saldo da Prisa deteriorou-se, em parte devido à crise. O peso do grupo baixou 89%. A influência da família Polanco diluiu-se ainda mais. Quanto à dívida, continua gigantesca – cerca de €3,5 mil milhões. Em janeiro de 2011, a Prisa anunciou a eliminação de 18% dos efetivos nas atividades em Espanha, Portugal e América Latina.
Mas Nicolas Berggruen e Martin Franklin fizeram uma excelente operação. Nos seus contratos, garantiram um retorno de 7,5% sobre a sua participação no grupo, durante os primeiros 3 anos após a entrada no capital, independentemente dos resultados obtidos pela Prisa...
Remunerações mirabolantes
O outro grande vencedor dessa recapitalização foi o próprio Juan Luis Cebrián, o emblemático “conselheiro adjunto” do Grupo Prisa. O catedrático de 68 anos atribuiu-se remunerações mirabolantes no auge da crise. Em 2011, a Prisa acusava uma perda de €450 milhões e o seu administrador, recebia ao mesmo tempo um cheque num valor situado entre 11 e 13 milhões de euros.
A extravagante remuneração de Cebrián tornou-se o símbolo do duplo padrão no seio do jornal mais respeitado de Espanha. Os sindicatos de jornalistas rapidamente se aperceberam do absurdo da situação: a soma embolsada pelo patrão em 2011 corresponde, grosso modo, à poupança na massa salarial que El País planeia fazer num ano inteiro com o despedimento de 129 jornalistas... Comparação fulminante!
Mas a saga de El País não fica por aqui. No verão passado, sempre para reduzir uma dívida pesadíssima, a direção da Prisa lançou-se numa nova manobra. Propôs a alguns dos seus credores, não dinheiro, porque não tinha, mas a conversão de títulos da dívida em participação no capital. Concretamente, os pesos pesados da banca espanhola, Santander e CaixaBank (bem como o HSBC), entraram bruscamente no capital da Prisa.
De repente, o conselho de administração do grande jornal espanhol progressista transformou-se numa assembleia de antigos e atuais conselheiros de bancos famosos.
Alguns jornalistas denunciaram o aparecimento, cada vez mais frequente [e suspeito], a seu ver, de artigos expondo os pontos de vista dos dois banqueiros emblemáticos de Espanha, Emilio Botin (um dos mais odiados do movimento dos Indignados, administrador do Santander) e Isidro Fainé (um ultraconservador que comanda o CaixaBank), desde que ambos se tornaram acionistas da Prisa. Por exemplo, o primeiro teve direito a uma página inteira, no dia 14 de novembro [dia de greve geral em Espanha] para apresentar um enésimo discurso sobre a gestão da crise na zona euro...
Águas turvas
Apenas uma história espanhola, sem mais? Não é bem assim. Nas águas turvas da Prisa navegam vários franceses, aparentemente com grande descontração. É o caso de Emmanuel Roman, homem forte do “hedge fund” britânico Man Group. Ou Alain Minc, versátil conselheiro e íntimo colaborador de Nicolas Sarkozy.
Como outros assessores da Prisa, Alain Minc recebeu, em 22 de outubro passado, poucos dias após o anúncio das demissões em El País, um belo bónus: um pacote de ações da Prisa (19.392 títulos) por serviços prestados. Azar o dele, o preço das ações baixou muito – para cerca de 0,4 nos dias de hoje – o que deixa esse “extra” em apenas 7.700 euros. Uma bagatela.
Espanha - A crise atinge duramente o setor da imprensa
Desde 2008, cerca de 200 órgãos de Comunicação Social escrita e multimédia fecharam portas em Espanha, revela El País. O diário madrileno, ele próprio fragilizado pela crise, fez eco de um relatório publicado em 13 de dezembro pela Associação de Imprensa de Madrid (APM).
Os números deixam clara a dimensão da tragédia: 6.400 postos de trabalho suprimidos; 132 revistas, 22 jornais pagos, 10 jornais gratuitos e inúmeros outros de difusão local encerrados. Um diário nacional, o Público, deixou de aparecer nas bancas em fevereiro de 2012, mas mantém a edição digital. Os motivos relacionam-se com a quebra do mercado publicitário, que sofreu uma queda de 39% no volume de negócios entre 2007 e 2011.
Outra consequência é um aumento de 22,8% no desemprego de jornalistas. Apesar disso, a profissão continua a atrair estudantes: as inscrições em cursos de jornalismo nas universidades aumentaram 2,5% este ano.

Contramaré… 27 dez.


Amigos,
Este não foi o Natal que merecíamos. Muitas famílias não tiveram na Consoada os pratos que se habituaram. Muitos não conseguiram ter a família toda à mesma mesa. E muitos não puderam dar aos filhos um simples presente.
Já aqui estivemos antes. Já nos sentámos em mesas em que a comida esticava para chegar a todos, já demos aos nossos filhos presentes menores porque não tínhamos como dar outros. Mas a verdade é que para muitos, este foi apenas mais um dia num ano cheio de sacrifícios, e penso muitas vezes neles e no que estão a sofrer.
A eles, e a todos vós, no fim deste ano tão difícil em que tanto já nos foi pedido, peço apenas que procurem a força para, quando olharem os vossos filhos e netos, o façam não com pesar mas com o orgulho de quem sabe que os sacrifícios que fazemos hoje, as difíceis decisões que estamos a tomar, fazemo-lo para que os nossos filhos tenham no futuro um Natal melhor.
A Laura e eu desejamos a todos umas Festas Felizes.
Um abraço,
Pedro.

Estamos vivos no deserto, mas com muito pouca água!

2012 anunciava-se extremamente perigoso para a zona euro e toda a UE. O pior não chegou, nomeadamente porque Angela Merkel fez concessões que permitiram a Mario Draghi, presidente do BCE, intervir. Em 2013, os europeus deverão continuar atentos.
"Esqueçamos, portanto, o calendário maia: é em Berlim que Cassandra se vingará ou será desmentida." Era assim que terminava a minha última coluna do ano passado. Parecia um prognóstico mas não era, pois permitia 2 fins completamente opostos. E também não revelava nada que não soubéssemos, pois havia tempo que tínhamos consciência de que todos os caminhos levavam a Berlim (embora com paragem prévia em Frankfurt, sede do Banco Central Europeu). Se recuperá-la tiver algum valor será o de nos recordar quão perto estivemos do abismo e, assim, ajudar-nos a entender onde estamos agora.
Ao longo de 2011, uma combinação letal de hesitações, preconceitos, miopia, ausência de liderança, divisões entre países e uma exasperante lentidão institucional conseguiu converter uma profunda crise económica em crise existencial, que pôs em causa a sobrevivência do euro. In extremis, o Banco Central Europeu inundou o mercado de liquidez, o que aliviou temporariamente os problemas mas não os solucionou.
É certo que, consciente da gravidade da crise, a chanceler alemã, Angela Merkel, tinha reconhecido publicamente em novembro (de 2011) que, "se o euro cair, a Europa cai". No entanto, a sua atuação ficou bem longe de convencer quem quer que fosse da determinação de levar esse discurso até às últimas consequências. Isso explica que, no primeiro semestre deste ano, alguns operadores financeiros tenham deixado de especular com a sobrevivência do euro, para dar mais um passo e começar a dar como certo o seu colapso.
A boa notícia do ano
A perceção de que os mercados financeiros estavam a começar a redenominar em moedas nacionais as dívidas contraídas em euros, prefigurando desse modo o dia depois do seu colapso, foi a linha vermelha de que o Banco Central Europeu precisava para agir e, ao mesmo tempo, o argumento de que o Governo alemão precisava para vencer a resistência daqueles que, na Alemanha, ainda pensavam que Espanha e Itália teriam de sobreviver por si mesmas ou sair do euro.
Com a sua declaração categórica, no mês de julho, no sentido de que "farei o que houver a fazer e, acreditem, será suficiente", a que se somou, em setembro, um programa de compra de dívida que tornava credível essa declaração, Mario Draghi conquistou o bem merecido título de homem do ano [do Financial Times]. E com razão, porque, a partir desse momento, qualquer operador financeiro que decidisse especular sobre o colapso do euro sabia que tal aposta estava perdida de antemão.
Mas, como se diz às vezes, por trás de um homem inteligente, há sempre uma mulher (escondida ou surpreendida?), o mérito cabe à chanceler Merkel, que, depois de ter arrastado os pés durante meses, e de ter até alimentado o ceticismo no seu próprio país, com declarações infelizes sobre o Sul da Europa, decidiu enfrentar o Bundesbank alemão, que votou contra essas medidas, e ignorar a ala mais dura do seu partido, reticente em aceitar, em primeiro ligar, o resgate bancário de Espanha e a intervenção do BCE para aliviar a pressão sobre o prémio de risco espanhol e italiano e, em segundo lugar, que se começasse a falar de união bancária. Assim, entre junho e setembro de 2012, o euro foi salvo. Essa é a boa notícia do ano.
Vivos, mas no deserto
A má notícia é que, apesar de o euro se ter salvado, e os seus integrantes também – pois, após meses de especulações, até a possível saída da Grécia parece grandemente remota –, o que ainda temos pela frente continua a ser extremamente complicado. Como demonstra o que aconteceu com os planos de união bancária, desvalorizados, adiados e cortados em sucessivas cimeiras, depois de a grande incerteza ter sido varrida, a política europeia voltou ao seu curso normal.
Regressa portanto a exasperação face à lentidão, à miopia e à falta de coragem política, uma vez que, por esta altura, todos sabemos o que é preciso fazer, tornando-se difícil explicar por que não se faz. E, entretanto, Angela Merkel, que durante alguns dias foi líder, volta à estreiteza que lhe impõe a agenda nacional, dominada pelas eleições [de setembro próximo].
Como que recordando-nos que as borboletas passam a maior parte do tempo numa feia e anódina crisálida e apenas uma ínfima parte a deslumbrar-nos com o seu voo e as suas cores. 2013 será um ano de transição, no qual dominarão duas sensações contraditórias: por um lado, a de termos deixado para trás o abismo, visível na diminuição do prémio de risco e na decisão do Governo [espanhol] de não pedir o resgate, e por outro, a da impossibilidade de negar que as políticas de ajustamento continuam a não funcionar e que não haverá estímulos externos que nos permitam crescer e gerar emprego. Estamos vivos, mas no deserto e com muito pouca água.