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sábado, 5 de janeiro de 2013

Sem contar com as despesas (de representação)…

Dublin assumiu, em 1 de janeiro, a presidência rotativa da União Europeia. Mas esta instituição foi esvaziada de conteúdo, devido à crise e à evolução dos equilíbrios de poder no interior da UE.
De 6 em 6 meses, repete-se a cena. Um país deixa a presidência do Conselho da União Europeia e outro vem substituí-lo. Quem sai enaltece o excelente trabalho que desenvolveu e o novo "presidente" anuncia que se vai esforçar para dar um salto qualitativo em matéria de integração europeia. O final de 2012 e o início de 2013 não são exceção, nesta tradição.
O Chipre tornou público o balanço dos seus 6 meses de presidência. "A nossa aspiração era levar um pouco mais longe a integração europeia e considero que os importantes resultados da nossa presidência são a prova do nosso êxito nesse domínio", congratulou-se Andreas Mavroyannis, responsável pelos Assuntos Europeus junto do Presidente cipriota. Por seu lado, a Irlanda, que assumiu a presidência da UE em 1 de janeiro, já anunciou que tenciona "promover o crescimento e o emprego".
Capacidade de contradição limitada
Tudo isto tresanda a propaganda e a lugares-comuns, em cujo uso a Europa é exímia. A realidade é bastante diferente. Podemos começar por contestar a "importância" do balanço da presidência cipriota, quando os debates sobre o orçamento europeu dividiram os países-membros, o Reino Unido ameaça abandonar a União, houve que encontrar uma enésima solução de emergência que não resolve nada em relação à crise da zona euro e, para terminar, a união bancária permanece no limbo. Mas essa não é a verdadeira questão. O verdadeiro problema é que a presidência cipriota não foi para aí tida nem achada. O “seu” balanço, aqui resumido, não foi minimamente seu.
No entanto, Nicósia não se empenhou menos do que Copenhaga ou Varsóvia antes dela. Que iniciativas podia desenvolver o Chipre, um pequeno país de 800.000 habitantes, durante a presidência oficial de uma União em crise, enquanto negociava com a mesma UE as condições de apoio financeiro para si própria? O que podiam fazer a Polónia ou a Dinamarca, dois países não membros da zona euro, para dar "um impulso" a uma União Europeia atacada na sua zona euro? E como poderia a Irlanda, atualmente a negociar uma redução de mais de €60 mil milhões de dívida bancária para com a UE e o BCE, impor os seus pontos de vista junto do resto dos 26 países da União?
Esta série de perguntas podia multiplicar-se indefinidamente. Numa União Europeia em profundas dificuldades, todos os países se encontram bloqueados pela crise da zona euro. Uma crise que depende sobretudo do principal contribuinte da União: a Alemanha. É em Berlim que é feita grande parte da política europeia de hoje. Simplesmente porque, sem a República Federal, nada é possível. Só os grandes países e instituições como a Comissão ou o BCE podem ainda, sob certas condições, fazer de contrapeso à Alemanha.
A França e a Espanha foram capazes de impor a união bancária a Berlim, mas nas condições ditadas pela própria Alemanha, nomeadamente, o ritmo de execução e o tipo de bancos abrangidos. O Reino Unido faz frente à Alemanha, chantageando com a sua saída da União Europeia. Mas a capacidade de contradição é muito limitada: o projeto da Comissão para reforçar o orçamento da UE, com vista a combater a crise, foi abandonado, após a rejeição alemã; e as tentativas francesas de imposição de uma "agenda de crescimento" passaram ao largo.
Os dignitários bizantinos
Seria, portanto, difícil que Nicósia ou Dublin pudessem impor ao contribuinte alemão a sua visão da Europa ou sequer levar o Governo alemão a um compromisso. A política europeia decide-se hoje principalmente entre Berlim e Bruxelas. Mas podemos perguntar se a presidência rotativa não estará mais vocacionada para preparar os processos, dar impulso, favorecer compromissos, e não tanto para dirigir a União. O problema é que, mesmo neste domínio, a presidência tornou-se uma formalidade.
Desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, em 2009, foi criado um cargo de presidente do Conselho Europeu, hoje ocupado pelo belga, amante de haikus, Herman van Rompuy. As suas competências são muito semelhantes às da presidência rotativa. Só que tem a vantagem de poder assegurar uma certa continuidade e coerência à elaboração das questões europeias. É ele, aliás, que dirige os serviços do Conselho que fomentam as decisões das reuniões. É, portanto, em Bruxelas que se decide a intervenção do Conselho, e só raramente nos países da presidência rotativa. Significativamente, desde 2004, as cimeiras europeias realizam-se em Bruxelas e não, como anteriormente, nos países da presidência rotativa.
Os representantes da presidência rotativa são, pois, espectadores de luxo. Têm prioridade protocolar, mas assemelham-se aos dignitários bizantinos, que tinham lugar nas cortes, mas não tinham qualquer poder. Todos os comunicados do Conselho para a imprensa tecem elogios ao trabalho e aos esforços desenvolvidos pelo país que preside à União Europeia. Mas é uma atitude obviamente formal. A presidência rotativa tornou-se uma espécie de montra que permite aos países tornarem-se mais conhecidos.
É uma oportunidade para divulgarem belos sites de Internet a evidenciar os méritos da sua nação (o da presidência irlandesa inclui um livro de receitas típicas muito completo) ou a salientar o turismo do país (como faz o do Chipre). Se isso permite atrair alguns turistas, ainda bem. Mas há outras iniciativas para esse tipo de promoção, como as "Cidades Europeias da Cultura". Não devíamos, pois, nestes tempos difíceis, acabar com uma instituição tão supérflua?
Visto da Irlanda - Jogada presidencial
Para Suzanne Lynch, especialista em Europa do Irish Times, o início do novo papel da Irlanda marca “6 meses de intensa atividade da UE em Dublin”. Esta é a 7.ª vez que a Irlanda assume a presidência, mas segundo ela, o espírito otimista que marcou anteriores períodos da história da UE contrasta com o prevalecente desânimo. E acrescenta:
Atualmente, a Europa está assolada pela dissidência e pela inquietação, enquanto tenta desesperadamente encontrar uma resposta para a crise financeira. Apesar da anunciada agenda do Governo para alcançar estabilidade, emprego e crescimento durante esta presidência, a verdade é que, muito provavelmente, será dominada pela questão do alívio da dívida, apostando especialmente na reformulação dos termos do empréstimo do Anglo Irish Bank, ao mesmo tempo que procura um regresso total ao mercado obrigacionista e a saída do programa de resgate FMI-UE.
A principal tarefa do Governo, nos próximos seis meses, será encaminhar legislação para os conselhos ministeriais, especialmente a reforma da Política Agrícola Comum. Suzanne Lynch continua:
O modo como o Estado equilibrará a sua agenda interna com a grande responsabilidade de procurar o bem da Europa através da sua atuação pode vir a ser o elemento definidor desta presidência.

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