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sábado, 23 de novembro de 2013

Masoquismo, sadismo e desonestidade intelectual…

Segundo um estudo redigido por Jan in ’t Veld, um economista da Comissão Europeia, as políticas de consolidação orçamental levadas a cabo na Europa nestes últimos anos têm tido efeitos negativos sobre o crescimento e o emprego.
Apesar de a França ter perdido 4,8% do crescimento acumulado entre 2011 e 2013 adianta o Libération, “o triste recorde de perda de riqueza cabe à Grécia: durante este mesmo período, as políticas de austeridade impostas a Atenas terão resultado numa perda de crescimento (sempre num período de 3 anos) de 8,05%. A Itália, a Espanha e Portugal terão perdido respetivamente o equivalente a 4,9%, 5,4% e 6,9% do PIB. Até mesmo a virtuosa Alemanha foi afetada por estas medidas (2,61%)”.
E o diário considera no seu editorial assinado por Eric Decouty, que há
Apesar de ter sido escrito por um único economista consagrado, o documento que contém o carimbo da Comissão não reflete apenas a opinião do autor. Confirma que em Bruxelas, o dogma da austeridade está a desintegrar-se progressivamente até desaparecer por completo.
Há alguns meses, Olivier Blanchard, o economista-chefe do FMI, tinha confessado os limites desta política e confessou ter subestimado os efeitos dos cortes orçamentais na Europa. A conclusão é agora largamente difundida em Paris, Bruxelas ou Washington: se o rigor é indispensável para restabelecer o equilíbrio das finanças públicas, não pode, por si só, constituir uma política económica. À falta de grandes projetos de desenvolvimento, a austeridade trava hoje a economia e alimenta a contestação e os populismos. Prova desta nova realidade, este debate ganha agora a Alemanha - e mesmo a CDU de Angela Merkel - onde, depois da última campanha eleitoral, muitas vozes defendem a necessidade de investir em grandes infraestruturas e de introduzir um salário mínimo.
Mas, além da análise, 2 dificuldades se põem de futuro aos economistas, em Bruxelas e aos governos de cada Estado: uma, a alternativa para o dogma dos últimos anos e outra, a capacidade de os Europeus para convencer a chanceler alemã de infletir a sua doutrina.
A recuperação e o crescimento, que passam necessariamente por Berlim, pressupõem uma Europa unida, para além do simples rigor das contas públicas.
Os ministros da Finanças da zona euro reuniram-se para debater a analise da Comissão Europeia às propostas de Orçamento para 2014, dos Estados-Membros da zona euro, que não estão ao abrigo de programa de assistência económica e financeira. Os orçamentos de Espanha, Itália, Finlândia e Malta evidenciam “riscos” de falharem as metas e foram “convidados” a modificar as propostas que apresentaram a Bruxelas.
“Convidamos esses Estados-membros a tomar medidas de consolidação apropriadas no âmbito do seu processo orçamental ou em paralelo”, afirmou o presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem.
De acordo com as regras do pacto de estabilidade e crescimento, que obriga os países a manter os orçamentos nacionais dentro de limites apertados em matéria de défice, as propostas dos quatro países apresentam “riscos”, mas os ministros daqueles países “comprometeram-se totalmente” em encontrar medidas para melhorar as suas propostas de orçamento.
“No caso de Espanha, fomos informados que estão a ser já preparadas medidas baseadas no plano de reforma do Estado, incluindo a segunda parte da reforma do mercado de trabalho”, disse o holandês.
Itália está já a cortar nas “despesas do Estado”, a levar a cabo um plano de “privatizações” além de “medidas fiscais”.
Malta informou que já adoptou medidas.
A Finlândia prometeu apresentar “em breve” um plano com reformas.
Para os 13 países analisados, o Eurogrupo defende medidas de combate ao desemprego, que “infelizmente (...) continua alto em alguns países”.
Portugal, assim como outros países sob programa de assistência financeira ficam excluídos deste exercício, uma vez que os seus orçamentos já são acompanhados no âmbito das avaliações regulares da troika.
Pois! Mais um estudo que confirma os efeitos secundários do remédio, mas já mete nojo o paradoxo entre as conclusões teórico-práticas e a continuação da mesma receita com os mesmos resultados… Se não tivéssemos a certeza de que isto é tudo orquestrado, até desconfiávamos de que nos estão a esmifrar até ao tutano.
Já chega a raiar a desonestidade intelectual e a prepotência política, esta dependência da vontade de uma senhora rica, que se permite, imperialmente, mexer (para pior) na vida de cidadãos de países da União em favor dos cidadãos do seu país, sobretudo dos mais ricos…
Como não chegasse, até os países “soberanos” estão debaixo da jurisdição de um ministro holandês, que manda bitaites sobre os Orçamentos de outros países-membros, sem que tenha outra solução, para o desemprego, do que um desabafo de comiseração: “infelizmente (...) continua alto em alguns países”.
E é por isso que não se compreende a preocupação dos nossos governantes com o ato “simbólico” da “tomada de S. Bento” pela polícia, que pode mostrar aos opressores, que estamos a exteriorizar os tais sinais de fadiga e de stresse, de que estão avisado e tem avisado (eles próprios) para estas emergentes atitudes…
Quem aguenta, indefinidamente, com roubos e mais roubos, com a dívida do país sempre a aumentar e as condições de vida do cidadão sempre a piorar?
Só masoquistas suportam esta sociopatia, mas é preciso que haja sádicos…
E há! Tannnnnntos…

Ecos da blogosfera - 23 nov.

Mais uma machadada no futuro, dada no presente…

Manuel Sobrinho Simões é um dos cientistas mais conhecidos do país. Há quase 25 anos que o instituto que dirige, e fundou, é uma referência na investigação do cancro em Portugal.
Samuel Silva 
O prestígio do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (Ipatimup) não o deixou incólume aos cortes no financiamento público e é dessa experiência e dos desafios que se colocam à ciência em tempos de crise que falará na conferência Ciência, Economia e Crise, que a Fundação Francisco Manuel dos Santos organiza na reitoria da Universidade do Porto.
Aos 66 anos, Sobrinho Simões não se imagina a deixar de trabalhar. “É tudo o que sei fazer.” E não disfarça o entusiasmo quando fala do próximo grande projecto em que está envolvido, o Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (I3S), que junta o Ipatimup aos institutos de Biologia Molecular e Celular (IBMC), de Engenharia Biomédica (INEB) e agora também a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, para integrar um consórcio de investigação na área da saúde, sobretudo de doenças neurodegenerativas e infecciosas, cancro e medicina regenerativa.
Nos últimos 15 anos, Portugal conseguiu fazer um caminho com o aumento do investimento em ciência, quer público quer privado, e obteve bons resultados. De quem foi o mérito?
O primeiro é um demérito, já que partimos muito de baixo. O segundo foi a capacidade de projectar o futuro do [ex-ministro da Ciência e Ensino Superior] Mariano Gago, que foi instrumental para desencadear e consolidar esta aposta. O terceiro mérito foi dos ministros do PSD que tiveram a pasta da Ciência. Nunca perturbaram esta estratégia, o que é uma coisa raríssima em Portugal.
A FCT [Fundação para a Ciência e a Tecnologia] está de uma incompetência como eu nunca vi. Está a mudar permanentemente as regras e os prazos. Não há coisa mais difícil do que alguém planear a sua vida sem um mínimo de estabilidade.
O que falhou?
Não conseguimos que as universidades e politécnicos contratassem tantos doutorados e pós-doutorados nos seus quadros como gostaríamos. E isto tem uma consequência, sobretudo numa fase de crise, porque eles não estão a encontrar emprego.
Há lugar para esses diplomados nas empresas? 
As nossas empresas não estão treinadas para fazerem investigação internamente. Temos um tecido empresarial fraco e que gosta muito de comprar “chave na mão”.
Os anteriores governos do PSD seguiram a linha inaugurada por Mariano Gago. Este não fez o mesmo?

Este Governo fez uma ruptura, o que não aconteceu só na ciência. Mas na ciência foi mais grave, porque é um tecido relativamente novo. Fez uma espécie de destruição criativa: rebentou com tudo, esperando que, das cinzas, nasça algo de novo. Na ciência, não nasce.

O que perdemos já com a austeridade?
Perdemos muita gente. E perdemos esperança. Na ciência, apesar de tudo, os nossos jovens têm capacidade para serem contratados, no estrangeiro, mas vão muito feridos de asa e dificilmente voltarão.
Isto é responsabilidade de quem?
De uma política cega em relação ao ensino superior. O Governo não percebeu que não pode rebentar com o tecido universitário.
Como vê a proposta do Orçamento do Estado para o sector?
É péssima, porque corta de uma forma cega. Não reforça as instituições que merecem e deviam ser premiadas. Ao mesmo tempo, deveria reformular as instituições que não merecem. Além disso, do lado da ciência, há uma ideia de que um investigador muito bom pode juntar 2 amigos e vai ali para o pátio do Hospital de S. João [no Porto] fazer um projecto de investigação.
É a cartilha do empreendedorismo aplicada à ciência?

Contramaré… 23 nov.

O director nacional da Polícia de Segurança Pública (PSP), superintendente Paulo Valente Gomes, colocou o lugar à disposição. E o ministro da Administração Interna comunicou que aceitou essa “disponibilidade”.
A demissão surge na sequência da manifestação de quinta-feira em frente à Assembleia da República, em que polícias invadiram a escadaria do Parlamento.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Um pouco de: “Todos contra as mesmas coisas”…

O histórico social-democrata, Pacheco Pereira, definiu-se como "membro de uma minoria em extinção" no PSD e apelou à mobilização de todos "não pelas mesmas coisas, mas contra as mesmas coisas".
Sempre ao ataque, contra o Governo, a troika e o processo de ajustamento da economia nacional, Pacheco Pereira foi corrosivo, falando da Constituição e das funções sociais do Estado: "Ninguém se mobiliza por uma lei, mas por aquilo para que uma lei serve. Ninguém se mobiliza apenas pelo Estado social como uma expressão abstrata, mas pela saúde, pela educação, pela segurança, pela habituação, pela justiça e pela proteção social."
Por isso, lamentou os sacrifícios que estão a ser exigidos aos portugueses. "Se alguns têm mais recursos financeiros não devem ajudar por caridade ou assistência, mas como forma natural de viver em sociedade. As famílias não ajustaram, empobreceram. E já nem comem bife, comem frango. Quando há frango...", atirou, condenando, por outro lado, os milhares de milhões gastos com as PPP e os contratos swap.
Ainda de dedo apontado ao Governo, criticou a forma como tenta agora "desresponsabilizar-se" das medidas que tem imposto ao utilizar como subterfúgio a "perda de soberania" ou a condição de "protetorado".
Pacheco Pereira rejeitou que os participantes na conferência de Mário Soares estejam à defesa na política, contrapondo que estão antes ao ataque contra o discurso de "falsidade" e o cinismo dos poderosos.
"Custa-me a ideia de que o papel dos que aqui estão seja apenas o de defender, como se estivessem condenados a travar uma luta de trincheiras. Não, os que aqui estão não estão a defender coisa nenhuma, mas a atacar a iniquidade, a injustiça, o desprezo, o cinismo dos poderosos", declarou. Na lógica "cínica dos poderosos", segundo Pacheco Pereira, "a vida decente de milhões de pessoas é entendida como um custo que se deve poupar".
"A transformação da palavra austeridade numa espécie de injunção moral serve para um primeiro-ministro [Pedro Passos Coelho], apanhado de lado pelo sucesso dos celtas [irlandeses] que muito gabava, sorrir cinicamente que a lição desses celtas e da Irlanda é que ainda precisamos de mais austeridade, mais desemprego e ainda precisamos de mais pobreza. O pior de tudo é que ao dizer isso [Passos Coelho] sorri muito contente consigo mesmo", disse.
O ex-dirigente e líder parlamentar do PSD insurgiu-se ainda contra "um discurso de contínua mentira e falsidade". "Um discurso que nos diz como se fosse uma evidência que as famílias ajustaram, as famílias ajustaram e só o Estado não ajustou, como se as 3 entidades fossem a mesma coisa e o verbo ajustar significasse o retorno a uma espécie estado natural das coisas que só o vício de se querer viver melhor levou os portugueses a abandonar", apontou.
Com ironia, Pacheco Pereira reconheceu que, na realidade, algumas empresas até ajustaram nos últimos anos. "Na verdade, pode dizer-se que algumas empresas ajustaram, mas algumas ajustaram falindo", observou.
À falta do discurso na totalidade, ficam alguns registos para todos pensarmos, não pelas mesmas coisas, mas contra as mesmas coisas, a favor da democracia, do cumprimento das promessas eleitorais, da coerência doutrinal, dos direitos constitucionais e dos direitos humanos…
Encontrado o discurso, ei-lo. Pacheco Pereira na Aula Magna

Os frutos da insensibilidade social e humana ou a troca de parceiro pelos mais fortes começam a aparecer com a acidez que se adivinha(va) há muito tempo…
Mais nada!

Ecos da blogosfera - 22 nov.

Eis a questão: O que acontece se um país sujeito a um programa de resgate decidir, finalmente, dizer Não?

Desde o início da crise financeira, o Executivo de Atenas tem aplicado contra vontade as medidas de austeridade. Mas, hoje, o Governo, fragilizado no Parlamento, tem cada vez mais razões – inclusive económicas – para dizer “não” aos credores.
O que acontece se um país sujeito a um programa de resgate decidir finalmente dizer Não?
Esta é uma pergunta que alguns funcionários da chamada “troika” de credores internacionais começaram a fazer a si próprios em relação à Grécia. No poder há mais de 1 ano, marcado pela resistência às exigências de reforma, o Governo de coligação grego continua a afirmar que não tolerará mais nenhumas medidas de austeridade.
Em muitos aspetos, a Grécia perdeu a capacidade de causar choque. Praticamente toda a sua dívida é detida por aqueles que lhe prestaram auxílio – governos europeus, instituições da zona euro e Fundo Monetário Internacional – o que quer dizer que o conjunto mais vasto dos mercados financeiros pouca atenção lhe presta.
E os impasses entre o Governo de Atenas e os supervisores do resgate tornaram-se tão triviais que deixaram de ser registados na maioria dos radares oficiais, inclusive em locais como Bruxelas e Berlim, onde os decisores políticos estão mais familiarizados com as contingências do desempenho grego.
Mas, se a mal disfarçada irritação que se notou nos últimos dias entre os negociadores de alto nível significa alguma coisa, então, talvez haja uma mudança de natureza, e não apenas de grau, na atual ronda de conversações, que se arrasta há 2 meses.
Riscos políticos
À primeira vista, a discussão centra-se num tópico já conhecido. O projeto de orçamento do Governo grego para 2014, que tem que estar concluído antes do pagamento da próxima tranche de ajuda, prevê um défice orçamental de cerca de 1.500 milhões de euros. O programa de privatizações, que é motivo de conflito, terá de ser revisto. As reformas estruturais, como o levantamento da moratória sobre a execução de hipotecas, também têm de ser acordadas.
Contudo, segundo aqueles que trabalham há anos no programa para a Grécia, parece estar a verificar-se uma mudança mais fundamental. O Governo de Atenas, que nunca mostrou grande entusiasmo pelas reformas, tem ainda menos razões para cooperar.
“Claramente, o que aconteceu foi que o número de vítimas políticas está a tornar-se mais evidente”, declarou um negociador de alto nível da troika. “Há apenas esta vaga de oposição.”
Sem dúvida que, boa parte disso é “fadiga das reformas”, que atingiu a Grécia e outros países resgatados, praticamente logo depois de os respetivos resgates serem postos em prática. Mas, em Atenas, os cálculos começaram a ser feitos de uma maneira que alguns receiam tenha enfraquecido os incentivos a um acordo.
Para o Governo grego, o fator mais óbvio a ter em conta é de ordem política. Apesar de ter sobrevivido, este mês, a mais uma moção de confiança, a sua maioria parlamentar continua a diminuir, resumindo-se agora a apenas 4 votos, num Parlamento com 300 assentos.
E, ao contrário do que se passa em Portugal, onde o Governo de coligação sobreviveu recentemente a uma experiência de quase morte, a oposição grega não é um partido tradicional que, no passado, apoiou o resgate. O Syriza, de extrema-esquerda, intimidou políticos de esquerda de todos os quadrantes – incluindo apoiantes do PASOK, o partido tradicional do centro-esquerda e membro da coligação governamental –, levando-os a opor-se ao programa.
O Syriza classifica-se constantemente como o maior partido da Grécia, enquanto o PASOK se encontra em agonia, repetidamente atrás do partido neonazi Aurora Dourada. Uma queda do Governo de coligação poderá muito bem significar o fim do programa de resgate, tal como o conhecemos.
Incentivos mudaram
Mas há ainda uma mudança maior, embora menos notada, na situação da Grécia. O Governo está a receber mais dinheiro do que gasta, não contando com os pagamentos de juros da dívida nacional. O atual “excedente orçamental primário” significa que cada dólar adicional de imposto arrancado aos eleitores gregos se destina a pagar aos credores.
Apesar de os funcionários da troika não estarem de acordo quanto a se será isso que está por trás da inflexibilidade recém-adquirida, historicamente, os governos que recebem ajuda internacional tornam-se menos cooperantes depois de puderem pagar na íntegra as suas atividades diárias. Na verdade, se pudesse contar com um banco central próprio para apoiar o setor financeiro nacional, seriam poucos os incentivos para que o Governo de Atenas continuasse a pagar fosse o que fosse à UE e ao FMI.
Os incentivos também mudaram na zona euro. Muitos consideram que os mecanismos e guarda-fogos da zona euro impedirão que a crise grega infete o resto [dos países] da moeda única. O próximo grande pagamento da dívida grega é ao Banco Central Europeu e está previsto para maio. Até lá, há muito poucas razões para disponibilizar qualquer ajuda à Grécia.
No interior da troika e nos Ministérios das Finanças nacionais, algumas pessoas sempre pensaram que a saída da Grécia da zona euro era inevitável. Se não encontrarem novos motivos para aceitar o compromisso, os governantes de Atenas e os seus credores oficiais poderão ver os seus piores receios tornarem-se realidade.

Contramaré… 22 nov.

A actividade privada continuou a progredir em Novembro na zona euro, mas mostrou ligeiros sinais de desaceleração pelo 2.º mês consecutivo, pondo em evidência a fragilidade da recuperação, anunciou a empresa de serviços de informação financeira Markit.
Para o economista da Markit, este novo recuo do crescimento deverá “incitar os responsáveis políticos a adoptarem novas medidas para evitar que a zona euro entre de novo em recessão”.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Isto é a CONVERGÊNCIA! Não é roubo, é um assalto! …ou Como se pode ludibriar um "chumbo" do TC…

O pagamento do subsídio de férias aos reformados e pensionistas da função pública foi feito, mas os acertos relativos ao IRS estão a “fazer mossa” no bolso de muita gente. Há casos de redução da ordem dos 80%. Noutros casos, o corte chega aos 45%, como aconteceu a Maria do Rosário Gama, presidente da Associação de Aposentados, Pensionistas e Reformados (APRE), que descreveu: “na minha folha de vencimento tenho 15 parcelas de desconto, 3 para ADSE, 9 para o IRS e 3 para a Contribuição Extraordinária de Solidariedade”.
Já a Federação Sindical da Administração Pública (FESAP) considera violentos os efeitos dos acertos no IRS no subsídio de férias que pensionistas e funcionários públicos recebem este mês.
“Vão ser os trabalhadores a pagar, mais uma vez, a pagar os erros do Governo ao receberem menos subsídio de férias agora no Natal por consequência do IRS. Os trabalhadores vão ter de pagar, desde Janeiro até agora, o diferencial do IRS numa tabela que foi concebida para 13 salários e agora vão receber 14 e, portanto, há casos em que as pessoas perdem 200, 300 e 400 euros, o que é uma violência”, disse o dirigente José Abraão.
De acordo o bastonário da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, Domingues Azevedo, um trabalhador pode ter, em média, uma redução de 35% no subsídio de férias, por força do acerto do IRS.
“Um susto” e “uma loucura”. São estas as expressões a que Rosário Gama, presidente da APRe, recorre quando quer resumir o conteúdo dos recibos que os reformados da Caixa Geral de Aposentações (CGA) receberam esta semana. Este foi o mês de pagamento do subsídio de férias, mas para muitos pensionistas, mais de metade daquilo que lhes foi pago foi “engolido” pelos descontos, nomeadamente pelo acerto do IRS, sobretaxa e IRS habitual, ADSE e Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES).
Ao todo, a coluna dos descontos  referentes ao mês de novembro inclui 14 parcelas, 8 das quais dizem respeito ao IRS. Ou seja, à sobretaxa e retenção mensal do imposto relativa à pensão e ao duodécimo do subsídio de Natal, soma-se agora a retenção e sobretaxa do subsídio de férias e dois “acertos” de imposto.   Rosário Gama desconfia de tantos acertos, pelo que a APRe está já a preparar um dossiê com cópias de recibos para remeter ao Provedor de Justiça.
A quantidade de reclamações que desde o início da semana começaram a chegar a APRe, vai igualmente motivar um pedido de explicações junto da CGA. “Não é razoável que façam todos estes descontos, mas queremos também saber se é legal aplicar em novembro o acerto do IRS para todo o ano, quando a lei que o prevê saiu em junho”, refere a presidente da APRe.
Os casos que estão a originar o maior número de reclamações são aqueles em que a soma total dos descontos é superior ao valor da sua pensão normal.  Tudo isto faz também com que os descontos absorvam mais de metade do montante bruto que resulta da soma da pensão, do subsídio de férias e do duodécimo. Num dos casos reportados, da CGA “saíram” 5.240 euros, mas à conta bancária do pensionista chegaram apenas 2.550 euros, ou seja 48% do total. Não é exemplo único.
Mesmo para valores de pensão mais baixa, os cálculos efetuados pela consultora PwC mostram que  o acerto do IRS absorveu uma fatia substancial e que ascende a 110 euros nas reformas de 1.000 euros e a 251 euros para pensões de 1.200 euros.
Além do IRS, os pensionistas com reformas acima dos 1.350 euros tiveram também agora de pagar CES sobre os 90% do subsídio de férias (que nos recibos da CGA vem identificado como “retroativo 14º mês”) processado este mês.
Em julho,  quando foram pagos os 10% do subsídio que o Governo tinha decidido repor (antes de conhecer a decisão do TC que obrigou à sua reposição integral) estes foram já sujeitos a CES, mas não a IRS e ADSE. Os recibos revelam, contudo, que no caso da ADSE, a taxa que foi aplicada à totalidade deste subsídio é de 1,5% -  que era a que vigorava em julho. (Não é o que consta)
Esta prática contraria contudo a informação que fonte oficial do Ministério das Finanças, segundo a qual   o “subsídio a pagar terá os descontos para a ADSE em vigor no momento do seu pagamento, ou seja, 2,25%”. (Confirma-se)
O valor líquido das reformas pagas este mês veio aumentar ainda mais o tom de indignação dos reformados. Mas na linha da frente dos seus protestos estão os cortes médios de 10% no valor das pensões pagas pela CGA que estão previstos no diploma da convergência. Esta lei está neste momento a ser apreciada pelo Presidente da República, havendo já vários pedidos para que a vete ou a remeta para o Tribunal Constitucional.
Como se pode verificar, a tal convergência entre o público e o privado (CGA e SS), só funciona quando há penalizações nominais para os funcionários públicos, mas já não há convergência quanto as mesmas medidas não se aplicam a todos…
Nem vou comentar, por falta de qualificação, se os descontos estão corretos, se a medida corretiva está conforme e cumpre o que o TC decidiu, mas penso, na minha inocência, que deve haver alguém ou alguma instituição (Tribunal Constitucional ou Tribunal de Contas), que investigue a conformidade do acórdão e o da retificação para que nem os cidadãos sejam ludibriados e muito menos que o acórdão do TC seja desrespeitado. Se assim não for, o TC pode determinar o que quer que seja e o governo pode fazer qualquer alteração que não responda à decisão…
Quanto à ADSE, o que os recibos registam são mesmo 2,25%, que como a notícia lembra, deveria ser de 1,5%, que era a taxa que vigorava na data do subsídio de férias.
E nesta hora de esbulho dos que servem e serviram o Estado, no público, que os seus “patrões” de momento, mal-agradecidos, se sintam mal com a sua consciência pela eficácia da convergência que estão a fazer com os (interesses) privados…
Privados são só os públicos… E ainda por cima, para nada!
Mau proveito!
 Última hora! A polícia percebeu que era povo quando recebeu o subsídio de férias…
 Imagem

Ecos da blogosfera - 21 nov.

Investimentos angolanos em Portugal (2/2)

Segunda parte da investigação do “Médiapart” sobre os bastidores das compras angolanas na ex-metrópole, na qual se descobre que os laços estreitos entre os políticos portugueses de todos os quadrantes e a ex-colónia não têm a ver com a “autocensura” dos órgãos de comunicação e da justiça portuguesa, e também da UE, quanto à origem nalguns casos duvidosa desses capitais.
Além de Isabel dos Santos, outros “empresários” angolanos fazem as suas compras em Portugal, como por exemplo o general “Kopelipa”, um ministro influente em Luanda, que investiu nos vinhos e em bancos da antiga metrópole. Em todos os casos, o princípio é idêntico: tirando partido de relações privilegiadas com o Presidente, estes homens e estas mulheres fizeram fortuna em condições duvidosas em Angola e adquirem ativos portugueses importantes, no contexto da aceleração da crise em Portugal.
“Portugal desempenha um papel estratégico para o poder angolano: permite à elite económica e política garantir uma escapatória, em caso de mudança de regime, pois uma parte das suas riquezas está armazenada em Portugal. Mas é também um país que serve de ‘lavandaria’ para os capitais angolanos duvidosos”, resume Jorge Costa, do Bloco de Esquerda (oposição), que, no princípio do próximo ano, vai publicar um livro sobre “os proprietários angolanos de Portugal”.
Um relatório, publicado em 2011 pela ONG Global Witness, analisa as contas – especialmente pouco transparentes – da indústria petrolífera de Angola. Conclui designadamente que existe uma diferença de nada menos de 87 milhões de barris de petróleo, no total da produção do ano de 2008, entre os registos elaborados pelo Ministério do Petróleo e os do Ministério das Finanças… Um exemplo entre outros das deficiências institucionais, que podem favorecer o desvio de dinheiros públicos.
Um debate tabu
Apesar da dimensão das manobras, o debate quase não agita a cena portuguesa. O caso das “desculpas diplomáticas” de Rui Machete praticamente não o afetou e o interessado acabou por escapar à demissão. “Todos os dirigentes políticos portugueses, do poder e da oposição, mantiveram laços com as forças angolanas, dos dois lados do conflito”, explica Pedro Rosa Mendes.
Originalmente de filiação marxista-leninista, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) aderiu à Internacional Socialista em 2003. Mantém portanto ligações estreitas com os comunistas e os socialistas, mas também as mantém com os sociais-democratas (direita) portugueses hoje no poder. “O MPLA soube sempre adaptar-se à situação, ao longo de gerações, e mudar de alianças consoante a evolução da conjuntura geopolítica”, acrescenta Pedro Rosa Mendes.
Segundo Jorge Costa, desde o regresso de Portugal à democracia, em 1974, 26 ministros e secretários de Estado portugueses ocuparam ou continuam a ocupar cargos em empresas angolanas, depois de terem exercido cargos públicos. O atual primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, passou uma parte da infância em Angola. A imprensa portuguesa especula igualmente sobre a existência de um “lóbi angolano” no interior do Governo, constituído por vários ministros que, na infância, viveram em Luanda.
Outra explicação para a fraca intensidade deste debate é quase tabu: alguns empresários começaram a comprar órgãos de comunicação portugueses, que, de repente, tendem e evitar o assunto. É o caso de Álvaro Sobrinho, um empresário de Luanda com grande visibilidade em Lisboa, que, através da sua holding Newshold, adquiriu ativos com prestígio no setor dos jornais em crise. Comprou na totalidade o semanário Sol e o diário i, ao mesmo tempo que adquiria ações de grupos que publicam outros títulos, como os semanários Visão e Expresso.
Há também a ter em conta a “autocensura”, segundo a expressão de Lisa Rimli, de uma parte do mundo económico, em especial das PME portuguesas, que têm medo de perder mercados de exportação, se o debate sobre os capitais angolanos se intensificar. Resumindo: a gravidade da crise proporciona a desculpa ideal para não se olhar com atenção para a cor do dinheiro.
Aqueles que, ainda assim, se atrevem a criticar na praça pública esta chuva de investimentos, correm o risco de serem rotulados de “racistas” ou de “neo-colonialistas” por Luanda. “Sou anticolonialista por convicção”, tem o cuidado de precisar Daniel Oliveira, jornalista do Expresso, na abertura de um texto no qual denuncia o silêncio que rodeia os investimentos angolanos no país.
A cumplicidade da Europa
Se o mal-estar domina em Lisboa, há outras instituições que brilham pela ausência. Quanto a este assunto, a Europa mantém-se muda. Marcolino Moco, antigo primeiro-ministro angolano que se tornou um dos mais ferozes adversários de José Eduardo dos Santos, interrogou-se recentemente sobre os silêncios da União Europeia: “Para preservar os seus interesses económicos em Angola, a Europa fecha os olhos a todas estas práticas abusivas.”
Para a deputada europeia socialista Ana Gomes, a Europa será mesmo cúmplice desta operação: “A austeridade e os programas de privatizações que a Europa exige a Portugal tiveram por efeito agravar a dependência do país relativamente a Angola. A Europa não só não diz nada, como ainda empurra mais nessa direção!”
Seja como for, não é de esperar uma reação da Comissão Europeia, antes das eleições europeias do próximo ano. O seu presidente desde 2004, José Manuel Durão Barroso, foi um dos primeiros-ministros portugueses mais próximos do regime de José Eduardo dos Santos. Em 2003, visitou Luanda acompanhado por 10 dos seus ministros. Na qualidade de presidente da Comissão, efetuou uma visita de 2 dias a Angola, em abril de 2012, para reforçar a cooperação da UE com o Governo de Luanda.
Barroso foi inclusive um dos convidados especiais do casamento, em 2003, de outra filha do Presidente angolano, Tchizé dos Santos. Esta última, mais discreta do que a sua meia-irmã Isabel, acaba aliás de comprar 30% de uma empresa portuguesa de embalagem de frutas.
Fim

Contramaré… 21 nov.

A Comissão Europeia alerta para o facto de que a situação laboral de professores com sucessivos contratos a termo é contrária a directiva europeia. Já em 2012 o provedor de Justiça sublinhara a necessidade de mudar a lei.
Em causa, segundo a CE, está o alegado tratamento discriminatório daqueles docentes, nomeadamente em termos de vencimento, em relação a professores do quadro que exercem funções semelhantes; e também o recurso a contratos a termo sucessivos, durante muitos anos, que colocam aqueles docentes em situação de precariedade, apesar de exercerem tarefas que correspondem a necessidades permanentes.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Mais uma "pressão" sobre o Tribunal Constitucional...

Jorge Miranda
1. Uma das questões mais candentes que se estão suscitando em Portugal e noutros países vem a ser a das pensões de aposentação, por haver poderes públicos e correntes de opinião que pretendem diminuí-las ou tributa-las especificamente, em nome da necessidade de propiciar pensões no futuro aos que agora se encontram ativos.
A Constituição, como se sabe, incumbe o Estado de, sem prejuízo das instituições de solidariedade social, organizar, coordenar e subsidiar um sistema de Segurança Social e de proteger os cidadãos na velhice (art.º 63.º, n.ºs 2, 3 e 5) e declara o direito das pessoas idosas à segurança económica (art.º 72.º, n.º 1) (1) - direito esse que, segundo o acórdão n.º 576/96 do Tribunal Constitucional, de 16 de abril (2), tem por núcleo essencial o pagamento de pensões.
Mas, no acórdão n.º 187/2013, de 5 de abril (3), este tribunal não declarou inconstitucional o art.º 78.º da lei orçamental para 2013 (a Lei n.º 66 B/2012, de 31 de dezembro) que (conquanto com antecedentes em leis orçamentais anteriores) criou uma "contribuição extraordinária de solidariedade" imposta aos pensionistas sobre a totalidade do valor mensal a partir de 1.350 euros, segundo escalões sucessivos (n.º 1) e com taxas acumuladas no caso de pensões superiores a 3.500 euros (n.º 2).
2. Para a tese que fez vencimento, essa contribuição não seria um imposto (por ser uma receita consignada e sem caráter de completa unilateralidade). Seria, sim, uma contribuição para a Segurança Social, enquadrável no tertium genus das "demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas" (4) do art.º 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição. Não eram, portanto, para o caso mobilizáveis as regras do art.º 104.º, nº 1 relativas ao imposto sobre o rendimento pessoal (n.º 74).
Os pensionistas afetados pela medida não se encontravam na mesma situação de quaisquer outros cidadãos, justamente porque beneficiários de pensões de reforma ou de aposentação e de complementos de reforma, e era a sua distintiva situação estatutária que determinava a incidência daquela contribuição, como medida conjuntural, com a finalidade específica de assegurar a sua participação no financiamento do sistema de segurança social, num contexto extraordinário de exigências de financiamento que, de outra forma, sobrecarregariam o Orçamento do Estado ou se transfeririam para as gerações futuras (n.º 75).
Não podia deixar de se reconhecer que as pessoas na situação de reforma ou aposentação, tendo chegado ao termo da sua vida ativa e obtido o direito ao pagamento de uma pensão calculada de acordo com as quotizações que deduziram para o sistema de Segurança Social, tinham expetativas legítimas na continuidade do quadro legislativo e na manutenção da posição jurídica de que eram titulares, não lhes sendo sequer exigível que tivessem feito planos de vida alternativos em relação a um possível desenvolvimento da atuação dos poderes públicos suscetível de se repercutir na sua esfera jurídica.
Todavia, em face do condicionalismo existente, não só as expetativas de estabilidade na ordem jurídica surgiam mais atenuadas como eram sobretudo atendíveis relevantes razões de interesse público que justificavam, em ponderação, uma excecional e transitória descontinuidade do comportamento estadual (n.º 79); e estava respeitado o princípio da proporcionalidade (n.º 80).
Tão pouco se verificaria violação de direitos patrimoniais, pois o cálculo do montante da pensão não teria de corresponder à aplicação de um princípio de correspetividade que pudesse resultar da capitalização individual das contribuições; mas radicava, antes, num critério de repartição assente num princípio de solidariedade, princípio este que apontaria para a responsabilidade coletiva das pessoas entre si na realização das finalidades do sistema e se concretizaria, num dos seus vetores, pela transferência de recursos entre cidadãos (n.º 81).
Mesmo quanto aos complementos de reforma, que funcionam segundo um regime de capitalização, eles estariam associados ao sistema de Segurança Social na sua integralidade, e estando em causa a incidência de uma contribuição similar às quotizações dos trabalhadores no ativo, não se via em que termos é que esses rendimentos deviam encontrar-se cobertos pelo âmbito de proteção do direito de propriedade, quando ainda se estaria no domínio da parafiscalidade (n.º 82).
3. Votaram vencidos os juízes Pedro Machete, J. Cunha Barbosa, Catarina Sarmento e Castro, Maria José Rangel de Mesquita e Fernando Vaz Ventura. Em comum, os 5 juízes contestaram a natureza atribuída à "contribuição" e invocaram violação dos princípios de igualdade e de tutela da confiança. Não é possível aqui resumir essas declarações de voto.
4. Não custa acreditar que, por detrás da decisão de criar a "contribuição extraordinária de sustentabilidade", estiveram direta e imediatamente preocupações de índole financeira e apresentadas como conjunturais. Não deixaram, no entanto, também de estar presentes considerações sobre a solvabilidade do sistema de segurança social e olhares para o médio e o longo prazo.
Apesar disso, afiguram-se-me bem convincentes os argumentos aduzidos pelos juízes que votaram vencidos, desde logo quanto à natureza de imposto dessa espécie tributária, muito mais do que o discurso justificativo do acórdão. Até as razões do interesse público vindas dos órgãos do poder político e que o acórdão pareceu acolher o confirmavam.
E impressiona observar que são aqui sujeitos passivos os aposentados, com o peso da idade e, tantas vezes, de doença, a terem de o suportar, sem deixarem de ter de pagar o IRS - donde, violação do princípio da unicidade do imposto sobre o rendimento pessoal do art.º 104.º, n.º 1 - e quaisquer outros impostos, como o IVA. E também de princípio de proporcionalidade. A Segurança Social está concebida para ajudar, entre outros, os idosos e, afinal, estes ainda têm de continuar a ajudá-la.
Há, por outro lado, uma afronta ao princípio da proteção da confiança (5). As pessoas que trabalharam toda a vida têm as legítimas expetativas de receber agora as pensões tal como foram definidas na altura própria e para as quais efetuaram os descontos legalmente estabelecidos nos seus salários. De resto, essas pessoas, enquanto ativas, também pagaram impostos através dos quais contribuíram para o sistema e, desde logo, para as pensões das gerações que as precederam (6). E, em muitos casos, são pessoas que somente agora ou há muitos poucos anos acederam a um patamar de libertação da extrema necessidade económica, ambiental e cultural em que antes, elas e os seus ascendentes, viveram. Ou pessoas que, na solidariedade familiar que, apesar de tudo, subsiste no nosso país, apoiam os filhos desempregados.
É certo que alguns pensionistas não contribuíram, nas suas carreiras ou nas funções que desempenharam, com montantes equivalentes aos que agora pretendem receber. Mas isso apenas obrigaria o legislador a distinguir, em vez de aplicar cegamente o mesmo regime a esses e aos demais, com preterição da igualdade e da proporcionalidade. E pode tratar-se por igual quem esteve 45 anos na função pública (dos quais 3 de serviço militar obrigatório) até aos 70 anos e quem se aposentou ao fim de muito menos anos?
A responsabilidade entre gerações implica a consideração de uma cadeia de gerações (para empregar uma fórmula do grande constitucionalista alemão Peter Häberle), presentes, passadas e futuras; e implica um verdadeiro contrato, um contrato entre elas, avalizado pelo Estado e pelas instituições da sociedade civil. Fora desta consciência por todos assumida não faz sentido configurar qualquer tipo de responsabilidade ou apelar à sustentabilidade do sistema.
5. Reproduzindo uma frase paradigmática do próprio Tribunal Constitucional: "A Constituição não pode certamente ficar alheia à realidade económica e financeira e em especial à verificação de uma situação que se possa considerar como sendo de grave dificuldade. Mas ela possui uma específica autonomia normativa que impede que os objetivos económicos ou financeiros prevaleçam, sem quaisquer limites, sobre parâmetros como o da igualdade, que a Constituição defende e deve fazer cumprir" (7).
Resta esperar que, perante anúncios ameaçadores de mais cortes nas pensões, o Tribunal Constitucional venha a ser duplamente coerente: com esta afirmação e com o seu reconhecimento do caráter conjuntural da dita "contribuição extraordinária de solidariedade”.
O que está em causa não é este ou aquele artigo avulso da Constituição - por mais importantes que sejam o art.º 63.º ou o art.º 72.º. O que está em causa é um complexo de princípios do Estado de direito democrático, comuns ao Direito Constitucional de todos os Estados da União Europeia e património da civilização jurídica.
1) A Constituição portuguesa e outras, como a italiana, de 1947, impondo à República "remover os obstáculos de ordem económica e social que, limitando, de facto, a liberdade e a igualdade dos cidadãos, impedem o pleno desenvolvimento da pessoa humana e a efetiva participação de todos os cidadãos na organização política e social do país" (art.º 3.º) e assegurando aos trabalhadores "o direito, em caso de velhice, a meios de previdência social adequados às suas exigências de vida" (art.º 38.º). Ou a Constituição espanhola, de 1978, adstringindo os poderes públicos a garantir, mediante pensões adequadas e periodicamente atualizadas, a suficiência económica dos cidadãos na terceira idade (art.º 50.º).
Recorde-se também a Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia, em cujo art.º 34.º, n.º 1 se lê "A União reconhece ou respeita o direito de acesso às prestações de Segurança Social e aos serviços sociais que concedem proteção em casos como a maternidade, a doença, os acidentes de trabalho, a dependência ou a velhice (…)”.
2) Diário da República, 2.ª série, de 19 de junho de 1996.
3) Ibidem, de 22 de abril de 2013.
4) O acórdão fala em "serviços públicos", o que não é bem o mesmo.
5) Cfr. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, IV, 5.ª ed., Coimbra, págs. 320 e segs., e autores citados.
6) Situação bem diferente é a das pensões de reforma, não contributivas, vindas das Leis n.ºs 26/84, de 31 de julho (art.º 8.º) e 4/85, de 9 de abril (art.ºs. 24.º e seguintes.), contrárias ao princípio da igualdade e ao princípio republicano de temporariedade dos cargos políticos (como escrevi no Manual …, IV, 1. ed., 1988, págs. 60-61). A Lei n.º 52 A/2005, de 10 de outubro, extinguiu-as, mas - em nome da proteção da confiança - não afetou as daqueles que já as estivessem recebendo. Só que, em tempo de crise, é de lamentar que nenhum dos beneficiários (algumas centenas) a elas não tenha até hoje renunciado por um elementar imperativo de solidariedade nacional.
7) Acórdão n.º 353/2012, de 5 de julho, in Diário da República, 1.ª série, de 20 de julho de 2012.
Professor catedrático da Universidade de Lisboa e da Universidade Católica Portuguesa

Ecos da blogosfera - 20 nov.

Investimentos angolanos em Portugal (1/2)

A braços com a crise, a antiga metrópole tornou-se um “supermercado” onde os novos milionários da ex-colónia, a começar pela família do Presidente José Eduardo dos Santos, fazem as suas compras nos setores da banca e do imobiliário. Mas, em Lisboa, começam a surgir preocupações quanto à origem duvidosa de alguns capitais, revela o “Mediapart”, num inquérito que publicamos em 2 partes.
Operação conciliação em Luanda: 14 deputados portugueses deslocaram-se no início de novembro à capital angolana, para tentar aliviar as tensões nas relações entre Portugal e a antiga colónia.
O ministro dos Negócios Estrangeiros português julgou estar a agir bem, ao apresentar, em meados de setembro, “desculpas diplomáticas” a Angola, a propósito de uma investigação em curso, de que são alvo nomes da diplomacia angolana em Portugal. Contudo, a sua iniciativa inesperada teve o efeito inverso: na verdade, tudo se complicou entre Lisboa e Luanda. No seu discurso sobre o estado da Nação, de 15 de outubro, o Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, no poder sem interrupção desde 1979, considerou que já não se encontravam reunidas as condições para uma “parceria estratégica”.
Em 21 de outubro, o Jornal de Angola, diário oficial do regime de Luanda, denunciava uma “agressão intolerável”, num editorial intitulado “Adeus lusofonia”. Várias semanas antes, referira já que Portugal não tinha “lições a dar” às suas antigas colónias.
Indignação imediata em Lisboa, onde políticos e editorialistas condenaram firmemente a atitude de subserviência do ministro. O que, por tabela, ofendeu o poder de Luanda, que se sentiu “agredido” por esta discussão explosiva em torno da relação de dependência que liga a ex-metrópole, à beira da falência, à sua antiga colónia, em plena ascensão económica.
Inversão de papéis
Uma “vingança” da História que, querem acreditar alguns órgãos de comunicação, se explica sobretudo pelo desfasamento brutal entre os 2 países. Enfrentando uma taxa de desemprego de cerca de 17% e uma recessão ainda em curso (-1,8% previstos para 2013), o Governo de Lisboa parece disposto a tudo para atrair investimentos estrangeiros. Em contrapartida, Angola apresenta taxas de crescimento impressionantes (próximas dos 15% ao longo dos anos 2000), graças aos preços do petróleo que disparam e à venda de diamantes, e é cortejada por investidores da China e do Brasil.
Símbolo desta inversão de papéis, a balança comercial de Portugal com Angola, ainda positiva em 2012, saltou para o vermelho nos 6 primeiros meses de 2013. Portugal importa agora mais petróleo angolano do que os produtos que consegue escoar para a antiga colónia. Em paralelo, os investimentos angolanos em Portugal, difíceis de quantificar, registam um aumento crescente desde o início dos anos 2000.
Acontece que Angola não é apenas uma ex-colónia portuguesa, com cerca de 19.000.000 de habitantes e saída de uma longa guerra civil em 2002. É também um dos Estados autoritários mais corruptos do mundo, que ocupa o 157.º na classificação da Transparency International (em 176) e é dirigido com a mais total falta de transparência pela família de José Eduardo dos Santos e pelo partido presidencial MPLA.
A “vingança do colonizado” é mais do que ambígua. Muitos “investimentos” angolanos, em imobiliário de luxo no litoral e na banca, são duvidosos e só beneficiam um pequeno círculo de empresários próximos do poder, em Luanda. Várias fontes contactadas pelo Mediapart em Lisboa descrevem um sistema alucinante, no qual Portugal funciona como centro de lavagem de dinheiro sujo pelos novos-ricos angolanos.
Para o ex-jornalista português Pedro Rosa Mendes, atualmente universitário na EHESS [Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales], esta prática de branqueamento de capitais começou muito antes da crise atual. Verifica-se desde o fim dos anos de 1990, quando Angola, então em plena guerra civil, atribuiu novas concessões de exploração das suas reservas petrolíferas. A decisão originou a explosão da produção de ouro negro no país, alimentou os cofres do Estado e reforçou de súbito a sua influência na cena internacional. A recessão nos países da Europa do Sul, a partir de 2008, veio apenas acelerar a grande mudança nas relações entre Angola e Portugal.
“A menina do papá”
Quantos são os que querem apoderar-se das joias da antiga metrópole? A ofensiva está a ser levada a cabo por famílias próximas da presidência, em Luanda –, no máximo algumas centenas de pessoas, que dispõem de vistos angolanos e portugueses. “Os jornais falam de ‘círculos presidenciais’. Mas, na vanguarda, estão sobretudo José Eduardo dos Santos, e a sua própria família”, considera Pedro Rosa Mendes.
A sua “própria família” e, em especial, a sua filha mais velha. Isabel dos Santos, de 40 anos, licenciada pelo King's College de Londres, a única mulher milionária de África é um dos personagens chave desta lamentável saga pós-colonial. Segundo a imprensa oficial angolana, Isabel dos Santos é a prova viva de que Angola, país onde 70% dos habitantes vivem com menos de 2 dólares por dia, pode também produzir success stories no coração da esfera financeira internacional. A herdeira, nascida de um primeiro casamento de José Eduardo dos Santos, detém hoje em Portugal uma impressionante carteira de ativos. Em poucos anos, apoderou-se de metade do capital de um gigante das telecomunicações (resultante da fusão da ZON e da Optimus) e uma boa parte do banco português BPI – do qual é a 2.ª acionista, com 19,4%. É igualmente membro do conselho de administração de outra instituição financeira, o BIC Portugal, e possui uma participação na Amorim Energia, que controla cerca de 40% da Galp, um dos principais grupos de gás e petróleo da Europa.
A “princesa” é hoje a 3.ª pessoa mais rica, devido ao valor da sua carteira de ações cotadas na Bolsa de Lisboa. Com uma fortuna avaliada em 1.700 milhões de dólares, tornou-se incontornável na paisagem económica portuguesa. À primeira vista, é difícil alguém não se congratular com a entrada massiva de novos capitais, numa altura em que o país está exangue… Mas o caso torna-se mais complicado, se nos interrogarmos sobre as origens duvidosas da fortuna de “Isabel”. Foi o que tentou fazer a revista norte-americana Forbes, num trabalho de investigação, publicado em setembro último, que causou muito barulho em Lisboa – e um pouco menos em Luanda. A sua conclusão é esmagadora: “A menina do papá” é uma criatura totalmente inventada pelo seu pai, para açambarcar, em proveito do seu “clã”, uma parte dos rendimentos dos bens públicos, do petróleo aos diamantes, antes de pôr esse dinheiro a salvo no estrangeiro – destino Portugal.
Fim da primeira parte